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GUSTAVO FRANCO
A crise (não) bancária
POR MAIS QUE pareça um clichê, não há como evitar a observação: é cedo para avaliações sobre uma coleção tão extraordinária de eventos como o da
semana que passou. Foram estonteantes as idas e vindas dos mercados diante de eventos de difícil
compreensão não apenas para o
leitor como para os profissionais
do ramo, muitos dos quais nunca
haviam visto nada parecido.
Tudo parece muito novo nesta
crise, a começar pelo fato de que
não é uma crise bancária, ao menos
por enquanto. Entender este aparente paradoxo já é um bom pedaço do caminho para se situar nessa
confusão.
A despeito de a crise ter sua origem no crédito imobiliário dito "de
segunda" (o já popular "subprime"), o que estamos vendo, após
um ano de reconhecimento de perdas (de cerca de US$ 500 bilhões) e
de recapitalizações (de cerca de
US$ 350 bilhões) em bancos comerciais, é que as áreas conflagradas são outras, adjacentes.
As inovações financeiras que geraram problemas -criaturas conhecidas como "crédito estruturado" e "derivativos de crédito"-
procriaram em um terreno que não
é propriamente dominado por
bancos comerciais, mas por um
complexo de instituições financeiras não-bancárias, incluindo securitizadoras, fundos mútuos de tipo
variado, seguradoras e, especialmente, as "megacorretoras", as estrelas de Wall Street, erroneamente misturadas entre bancos, pois
nem recebem depósitos, nem fazem crédito.
Pois bem, com mais de um ano
de crise, nenhum grande banco comercial foi objeto de intervenção, e
os maiores "eventos" se deram exatamente nessas instituições não-bancárias: securitizadoras (Fannie
May e Freddie Mac), "mega-corretoras" (Bear Sterns, Merrill Lynch,
Lehman Brothers) e uma seguradora (AIG).
Curiosamente, os bancos comerciais, que estiveram no centro do
problema durante o ano que passou, terminam a semana como parte proeminente da solução. Eles já
digeriram boa parte do lixo tóxico
encontrado em seus balanços, e a
sensação é a de que a regulação não
falhou inteiramente aí, mas no planeta vizinho, o do sistema "não-bancário". Foram as ações dos bancos que reagiram mais acentuadamente à notícia da criação de uma
agência governamental com vistas
à aquisição de créditos ou títulos
com lastro em crédito hipotecário,
à semelhança do que foi feito na última crise hipotecária, nos anos
1980.
Ao fim das contas, as crises bancárias, ou não-bancárias, acabam,
ou não acabam, todas parecidas.
gh.franco@uol.com.br
GUSTAVO FRANCO escreve aos sábados nesta
coluna.
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