São Paulo, domingo, 20 de outubro de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Riscos e oportunidades

HORACIO LAFER PIVA


Apesar do espetáculo de democracia, a ser copiado por qualquer região desenvolvida, temos agora de agir

Vivemos momentos de emoção. E, espero, de oportunidades. A economia americana não avança, uma guerra contra o Iraque poderá ter consequências imprevisíveis, a Europa mantém-se estagnada, o Japão caminha problematicamente, a América Latina está enfraquecida e o Brasil não sai das manchetes.
O país está fragilizado em função de vários acontecimentos: ataques à moeda, desinformação e declarações desastrosas, a situação mundial, um crônico quociente entre dívida pública e PIB e, claro, tensão pré-eleitoral.
Apesar do espetáculo de democracia, a ser copiado por qualquer região desenvolvida, temos agora de agir, e contamos com pouco tempo e simpatia por parte de nossos financiadores, que, temerosos de que tenhamos problemas mais sérios, parecem não perceber que, de fato, nós os teremos se assim continuarem a se comportar.
Insistimos na Fiesp que o país é maior do que qualquer partido e não vai acabar. Mas não pode perder tempo, razão pela qual não recuamos em pedir aos candidatos que apresentem projetos claros e operacionais que se distanciem de propostas genéricas ao sabor do marketing de suas campanhas.
Meses de debates, embora genéricos, e um consenso claro quanto ao diagnóstico dos gargalos pavimentaram a cobrança, por parte da sociedade, de um plano devidamente amarrado e que fuja do "o quê" para se aplicar no "como".
Não cabe entrar na discussão do dia-a-dia das eleições, mas, ao mesmo tempo em que reiteramos a maioridade da democracia brasileira, lamentamos tantos preconceitos contra o candidato Lula que chegam via internet, além de piadas sem graça, e as avaliações simplistas quanto ao candidato Serra, como se a simpatia fosse condição "sine qua non" para uma boa gestão. O que importa é que a sabedoria popular, que no primeiro turno avançou no processo de depuração da política nacional, haverá de escolher o melhor; e olhar à frente é o papel que nos é atribuído.
Reiteramos, assim, que a rapidez será um fator de diferenciação na percepção de sucesso ou fracasso por parte dos investidores e consumidores. Rapidez em apresentar a equipe, fundada na credibilidade. Rapidez em montar uma agenda, mesmo que de partida. Rapidez em acertar a coalizão, a base de sustentação no Congresso, que tanta importância ganha agora -e é o que, de fato, garantirá ao novo presidente condições reais de governabilidade. E rapidez em contar, no Executivo, com os muitos talentos que, embora hoje estejam em campos opostos, pela via da disputa, enfim desejam o mesmo para o Brasil.
Há assuntos urgentes e outros decisivos. Emprego, segurança, distribuição de renda, crédito e juros, reformas, desenvolvimento, inserção internacional via comércio e negociação de formação de blocos estão na pauta do dia. Temperado com a crise, some-se ainda o desafio de lidar com uma sociedade aflita por mudanças. É preciso compreender as dificuldades atuais e a impossibilidade de qualquer gestão obter soluções em pouco tempo.
Não há, portanto, mais espaço para ingenuidade e retórica. Estamos em foco e, embora alguns insistam em dizer que tudo caminha de maneira absolutamente controlada, o fato é que a economia segue estagnada, as empresas mais endividadas, o mercado desconfiado e a margem de manobra reduzida.
O presidente que assumir o faz em difícil momento, tendo de lidar com a pressão interna e um atento olhar externo. Terá de se ocupar em acalmar a todos e imediatamente iniciar a pavimentação de um equilíbrio que o leve a sofrer, nos dois primeiros anos de governo, para definitivamente se realizar como homem público nos dois seguintes.
Nem mais o tempo para lamentações ou busca de culpados nos resta agora. O Brasil tem a oportunidade de provar que pode conviver com as adversidades econômicas e as tensões políticas e as superar, desta vez mantendo firme sua decisão de inserção global e respeito aos avanços conseguidos internamente.
Terá de resistir ao risco e ao apelo da inflação, encontrar o espaço correto para seu ativismo governamental, operar a readequação das contas do Orçamento nacional, tornar vivo o exercício da interlocução, ganhar tempo e, principalmente, solidária compreensão.
Um belo desafio, ao qual estamos prontos a agregar nossa experiência de homens da produção. Um momento de decisão para este país. Um fio da navalha a testar nossa capacidade e limites. Uma lição, um ponto de inflexão.

Horacio Lafer Piva, 45, é presidente da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp).



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