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JOSÉ SARNEY
No espaço sideral
A AVENTURA espacial, diz o
historiador, cientista e político francês Claude Allègre,
foi ao mesmo tempo um sonho e
uma decepção. A presença do homem no espaço é cara e ineficaz. A
fantasia das redes universais Iridium e Global Star foi suplantada
pela velha tecnologia dos cabos
submarinos, agora óticos.
Mas restou a ciência. O Hubble é
uma maravilha que persiste depois
que sua vida útil terminou. As sondas espaciais revelam detalhes dos
outros planetas. Os satélites de observação e informação (como GPS,
Galileo), cada vez mais miniaturizados, abrem extraordinárias perspectivas às ciências geográficas.
Vejo, siderado, que o Bush resolveu se meter com o espaço e decretou que "os propósitos pacíficos
(grifo deles) da exploração do espaço permitem as atividades de
defesa e inteligência na busca dos
interesses nacionais". E "os controles sobre armas propostos não
devem atrapalhar os direitos dos
EUA de pesquisar, proceder a ensaios ou ter outras atividades no
espaço". Atividades militares, entenda-se.
O maior volume de recursos
americanos para a pesquisa espacial não é o da Nasa; é o das unidades militares, como as bases Vanderberg e Spawar, na Califórnia, e
Arnold (AEDC), no Tennessee. Isso passa um retrato assustador do
desprezo da política americana pelo mundo. A mesma falta de respeito que tem pelo direito que a Revolução Americana trouxe ao mundo
na declaração de Jefferson e agora
é revogado pela nova lei sobre tribunais militares, com a qual Bush
avisou aos tribunais que o direito
de habeas corpus está suspenso em
relação aos prisioneiros de Guantánamo. É a primeira vez que o habeas corpus é suspenso nos EUA
desde a Guerra Civil. Eles podem
ainda persuadir confissões com
métodos "alternativos".
Mas não só más notícias vêm de
lá. Uma conferência de prefeitos
americanos anuncia que 168 grandes cidades, como Seattle (de
quem partiu a iniciativa), Nova
York e Los Angeles, decidiram
aplicar o Protocolo de Kyoto.
A idéia do espaço sideral, infinitamente em expansão e estendido
no tempo -no céu vemos estrelas,
buracos negros, poeira, radiação
como eram há milhões e bilhões de
anos-, deveria levar-nos a pensar
mais no nosso mundo e em nossas
limitações. "Podemos inflar nossos
conceitos além dos espaços imagináveis, só criamos átomos, em detrimento da realidade das coisas",
dizia Pascal. A realidade é a Terra
ameaçada pela violência e pela
guerra, pela destruição do homem
e da natureza.
Fiquemos com os satélites, que
podem e devem nos ajudar, controlando queimadas e desmatamentos. E com o sonho do espaço
como símbolo da paz.
jose-sarneyuol.com.br
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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