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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Nosso projeto, minha história
SÃO PAULO - Os debates entre Dilma Rousseff e José Serra tendem a
ser provas de resistência à paciência do espectador. Protegidos por
regras que restringem ao máximo a
participação de jornalistas e reduzem ao mínimo a exposição a questões e temas espinhosos, os candidatos travam duelos marcados por
uma enorme chatice tecnocrática.
Quem, no entanto, consegue
atravessar o mar de números, siglas
e promessas cruzadas, até chegar
às famigeradas "considerações finais" de cada um, pode notar que
existe, sim, uma diferença fundamental entre a petista e o tucano:
Dilma se despede como aquela que
"representa" o "nosso projeto", referindo-se ao governo Lula, do qual
é uma peça, ou a protagonista acidental; Serra, por sua vez, conclui
oferecendo ao eleitor a "minha história de vida" -biografia, valores,
trajetória político-administrativa.
No caso de Dilma, o "nós" ocupa
o primeiro plano -este é o seu trunfo e o biombo atrás do qual ela procura esconder suas vulnerabilidades. No caso de Serra, o "eu", inflado, toma a frente da mensagem política, ou se confunde com ela, como quem dissesse "la garantia soy
yo", o resto se ajeita depois.
Dito de outra forma: a candidatura de Dilma é maior que a própria
candidata, enquanto o candidato
Serra é maior que a sua candidatura. Mas não apenas isso.
Caso se confirme o favoritismo
petista, ninguém sabe ao certo,
nem a própria Dilma, o que será do
"projeto" quando Lula sair de cena.
A campanha de Dilma celebra o
presente, muito mais do que aponta soluções para o futuro.
Mas, com Serra, poucas vezes o
país assistiu a uma campanha tão
marcadamente personalista, o que,
por ironia, o aproxima da tradição
populista, que os tucanos -"técnicos", "racionais"- tanto gostam de
criticar. Serra, com sua egotrip,
sempre acreditou que poderia chegar à Presidência sem assumir compromissos com ninguém; desobrigou assim os aliados de assumirem
qualquer compromisso com ele.
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