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MARCOS NOBRE
A cor da consciência
A CONSCIÊNCIA negra é comemorada hoje em muitas
cidades brasileiras. Seu significado é o de dizer que a raiz do
preconceito e da discriminação está na imposição duradoura de uma
cultura excludente e intolerante.
O anti-racismo tem diferentes
respostas para o que deve ser a
consciência negra. O fomento da
cultura negra pode significar uma
polarização política intransigente
com a cultura dominante para se
colocar em bloco como alternativa
a ela. Como pode significar que a
disputa é para transformar essa
cultura dominante de tal maneira
que ela seja obrigada a reconhecer
e incluir negras e negros como protagonistas da história brasileira.
Os argumentos das duas posições são convincentes. Para combater uma cultura secular de exclusão pode ser que não haja outro caminho senão o confronto em bloco.
Como pode ser possível que haja
espaço para impor o reconhecimento e a tolerância como critérios fundamentais de uma cultura
compartilhada.
É uma decisão política estratégica optar por um caminho ou por
outro. Em qualquer dos casos, o decisivo é a definição do que significa
ser negro no Brasil. E cada posição
propõe uma visão diferente do que
seja a identidade negra.
O importante nessa discussão é
que não se parta de definições prévias. Cabe aos próprios agentes
desse processo encontrar as suas
respostas e a maneira de fazê-las
valer na discussão pública e na
ação política.
Um instrumento importante para isso é o direito. Traduzir a consciência negra em direitos reconhecidos faz das normas jurídicas plataformas para transformações sociais. Mas, se a aprovação de novas
leis é um importante começo, fazê-las valer é um processo longo e
complexo. Também os tribunais
são um espaço de disputa pelo sentido da lei. A aplicação de uma norma não é evidente por si mesma.
Como também não são óbvias e
previsíveis as interpretações que
surgirão do debate público e da disputa política.
Por isso mesmo é desejável que
as leis atualmente em debate, principalmente o Estatuto da Igualdade Racial, procurem deixar o máximo possível aberta a definição da
identidade negra. Quanto mais limitados os parâmetros legais, tanto mais estreitas as opções para as
disputas políticas que se iniciam
com a aprovação de uma lei. E tanto mais estreito o espaço para que
essa identidade seja construída pelos agentes, tanto mais estreito o
espaço para interpretações inovadoras e imprevistas.
Porque não apenas a consciência
negra são muitas. Também o racismo a ser combatido tem sempre
muitas e novas caras.
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta
coluna.
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