São Paulo, sábado, 20 de novembro de 2010

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Jogo sujo

Parlamentares favoráveis aos bingos tentam ressuscitar atividade com argumento oportunista de que poderia contribuir para área de saúde

Mais verbas para a área de saúde: a esta altura, não há brasileiro que necessite de legendas para atinar de imediato com a tradução da frase, que equivaleria, nos velhos filmes de faroeste, ao clássico "mãos ao alto".
Desde que se inventou a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras), em 1997, utilizou-se a necessidade de investir no atendimento médico da população como pretexto para aumentar as receitas do governo.
Dos bilhões arrecadados com essa taxa, parte significativa, embora não majoritária, manteve-se no caixa do Tesouro; nos últimos anos da vigência do tributo, cerca da metade dos recursos obtidos não era empregada para o fim a que supostamente se destinava.
Durou dez anos a contribuição, cuja qualificação de "provisória" já constava como peça fácil do anedotário nacional. Eliminada pelo Senado em 2007, não sem previsões apocalípticas quanto ao impacto negativo que a decisão traria às contas públicas -o que não ocorreu-, seu retorno continua a ser sonhado por muitos.
Com o nome de CSS (Contribuição Social para a Saúde), sensibilizaria, ao que se noticia, a presidente eleita Dilma Rousseff. Governadores, interessados em novas receitas, já opinaram a favor do retorno do tributo.
Vale lembrar que, enquanto isso, de 2002 a 2009, os gastos reais com saúde cresceram 93% nas áreas federal, estadual e municipal. Se se trata de procurar um pretexto para a criação de novos impostos, há de se convir que, à luz de dados como este, o da saúde não se sustenta. Há outros meios de aumentar os investimentos e a eficiência do Estado nessa área crucial para a população.
Pouco importa: o lema da saúde higieniza tudo -e é assim que lideranças da base governista no Congresso articularam-se em torno de uma fórmula oportunista.
Os deputados Paulo Pereira da Silva (PDT) e Sandro Mabel (PR) defendem a liberação dos bingos; também o líder do PTB, Jovair Arantes, já se manifestou a favor da jogatina. Argumentam então que, legalizando-se a atividade, haveria um ganho de receita a ser canalizado para a saúde, evitando-se assim a volta da CPMF.
Foi comum, durante certo tempo, dizer que os bingos tinham a vantagem de gerar empregos -como se outras atividades econômicas, insuspeitas de desvios, não fizessem o mesmo. Chega-se ao cúmulo, agora, de inventar o "bingo do bem", supostamente voltado a garantir recursos para atender a saúde da população.
Durante seu apogeu, casos de dependência psicológica, delinquência e ruína familiar se sucederam em nome de suposto auxílio a entidades esportivas; hospitais e postos de saúde seriam, agora, a cortina de fumaça para justificar a volta de uma atividade que só cabe qualificar como maléfica.
Ou os bingos ou a volta da CPMF: eis, na prática, a alternativa colocada por esses parlamentares à sociedade brasileira. Cabe rejeitá-la, numa atitude que ultrapassa a da mera indignação.


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