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TENDÊNCIAS/DEBATES
Segurança não se resume a polícia
HUGO ACERO VELÁSQUEZ
Foi sob essa perspectiva de integralidade que foram implementadas as políticas de segurança e convivência de Bogotá, na Colômbia
NA AMÉRICA Latina, a gestão
institucional da segurança dos
cidadãos tem tradicionalmente ficado a cargo das instituições armadas, predominando o caráter policial e militar. É uma situação herdada
da Guerra Fria e que persiste hoje na
maioria dos países da região.
Pode-se afirmar que os governos
democraticamente eleitos ainda não
conseguiram conferir um caráter civil
ao tratamento da questão e menos
ainda um tratamento integral a um
problema sobre o qual a maioria dos
especialistas concorda em dizer que é
complexo e tem causas múltiplas,
problema para o qual a resposta policial é insuficiente e, quando se recorre aos militares, inapropriada.
Falar do tratamento integral da insegurança supõe reconhecer que
existem múltiplas violências e muitos
fatos que afetam a convivência dos cidadãos. São violências que vão desde
as psicológicas e físicas registradas no
interior dos lares, nas comunidades e
nas ruas, em razão de conflitos diversos, até as violências cometidas por
criminosos e delinqüentes.
Também supõe reconhecer que
existem fatos que afetam a convivência cidadã, como a resolução violenta
dos conflitos e a sensação de intranqüilidade e insegurança gerada pela
presença de lixo nas ruas, pela falta de
iluminação pública, pela deterioração
dos espaços públicos, pelo barulho,
pela mendicância e pela invasão do
espaço público.
Para fazer frente a esses problemas,
é necessário traçar e executar políticas públicas integrais de convivência
e segurança dos cidadãos.
Essas políticas devem partir da premissa básica de que as ações terão que
ser empreendidas num espectro amplo, que abrange desde o nível preventivo -entendido como a prevenção do aparecimento de riscos e o
controle de sua difusão- até os níveis
legítimos de coerção dentro do Estado de Direito.
Ou seja, é preciso contar com uma
política pública que preveja, dissuada
e exerça o uso legítimo da força para
fazer frente a atos que sejam criminosos e violentos.
Uma política pública que seja desenvolvida dentro do quadro do Estado de Direito, respeitando os direitos
humanos.
Uma política que, no âmbito preventivo, desenvolva programas e projetos que fortaleçam a cultura cidadã,
o controle dos riscos (desarmamento,
atenção ao consumo de álcool e outras drogas, prevenção e assistência a
emergências) e a atenção a grupos
vulneráveis (jovens, prostitutas, indigentes, migrantes) e que promova
programas para aproximar a Justiça
do cidadão, favorecendo a resolução
pacífica de conflitos familiares, interpessoais e comunitários.
Uma política pública que fortaleça
os organismos de segurança e Justiça
para que, de maneira profissional,
realizem trabalhos de coleta de informações, investigação criminal, perseguição e captura de criminosos, julgamento e condenação.
Uma política pública que fortaleça
o sistema carcerário, para que este
possa cumprir as funções de punição
exemplar do delinqüente, com cumprimento da pena com estrita disciplina e respeito pelos direitos humanos, de ressocialização e de reinserção social dos condenados.
São essas as características de uma
política integral que deve ser implementada pelos governos nacionais e
locais democraticamente eleitos, independentemente de serem de direita, de centro ou de esquerda.
O importante é que a política de segurança deve ser tratada sob uma ótica civil, com um responsável que
coordene todas as ações e instituições
envolvidas nos programas e projetos
e que também coordene o trabalho
com outras instâncias governamentais importantes, como as áreas da
educação, da saúde, do desenvolvimento urbano e dos transportes, entre outros, para melhorar a convivência e a segurança dos cidadãos.
Foi sob essa perspectiva de integralidade que foram implementadas as
políticas de segurança e convivência
de Bogotá e Medellín, na Colômbia,
cujos resultados são internacionalmente reconhecidos pela redução da
violência verificada.
No caso de Bogotá, passou-se de um
índice de 80 homicídios para cada 100
mil habitantes, em 1994, para 23 homicídios por 100 mil habitantes em
2003 -e hoje são 18 homicídios por
100 mil habitantes. No caso de Medellín, a redução foi de 174 homicídios
por 100 mil habitantes para 36 homicídios para cada 100 mil habitantes.
HUGO ACERO VELÁSQUEZ, 46, sociólogo, consultor do
Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), foi secretário de Segurança Cidadã de Bogotá
(Colômbia) entre 1995 e 2003.
Tradução de Clara Allain.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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