|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Fantasia plástica
XICO GRAZIANO
O lobby da indústria do petróleo é fortíssimo. E, quase sempre, disfarçado. Oxibiodegradável se chama sua roupa de Carnaval
NADA DE sacolinha plástica. A
Secretaria do Meio Ambiente
do Estado de São Paulo inovou
a campanha Verão Limpo/2008, distribuindo 1 milhão de sacolas retornáveis aos usuários das 295 praias paulistas. Seiscentos monitores e 6.000
vendedores ambulantes estão engajados na campanha. Confeccionadas
com fibra de algodão e material reciclado, tais sacolas carregam uma
mensagem ambiental ao turista. Jogue limpo na areia.
Questão de coerência. O governo
paulista abriu uma frente de luta ecológica contra o uso exagerado do plástico na sociedade. As razões são notórias. O resistente e prático polímero,
derivado do petróleo, está emporcalhando o mundo. Estima-se um consumo de 500 bilhões de sacos plásticos por ano, ou seja, 1,5 bilhão por dia
ou, ainda, 1 milhão por minuto. Vacas
sagradas na Índia morrem engasgadas; aterros sanitários se entopem.
O "mutirão ambiental" consolida
uma de nossas estratégias de trabalho. Nesse, como em outros assuntos,
é preciso alterar a atitude das pessoas,
mudando seu comportamento ambiental. A conscientização da cidadania modifica hábitos de consumo.
Assim, promovemos, em 8 de dezembro passado, um mutirão com o
seguinte mote: "Nas compras de Natal, evite a sacola plástica". Foi um sucesso, embora preliminar.
Muitas lojas, especialmente na capital, interessadas em conquistar clientes e agregar novo valor aos seus negócios, informaram que irão substituir suas
embalagens de vendas. Rumo ao consumo sustentável.
Na outra ponta, busca-se a produção mais limpa. O governo paulista
está prestes a regulamentar a lei estadual de resíduos sólidos. Em decreto,
o governador Serra estabelecerá, claramente, a co-responsabilidade das
empresas que produzem ou se utilizam de material plástico em seus negócios. Vale para outros resíduos
também. A regra é simples: quem produz lixo se obriga a resolver o problema da poluição.
Assim, vai aumentar a reciclagem
do plástico. Hoje, boa parte das embalagens de refrigerantes, cerca de 50%,
já está sendo reutilizada. A própria indústria se compromete com esse esforço que, evidentemente, não pode
mais ficar sob responsabilidade única
dos pobres catadores de rua.
Seguindo essa linha, projeto de lei
do governo, em elaboração final na
Secretaria do Meio Ambiente, visa
impedir, no território paulista, a produção e a comercialização de bebidas
alcoólicas, especialmente cerveja, em
recipientes à base de resina plástica,
especialmente o famoso PET (tereftalato de polietileno). Já imaginaram
espalhar por aí, atiradas das janelas
dos carros, alguns bilhões de garrafas
plásticas vazias depois da bebedeira?
Inaceitável.
Quanto às demais bebidas ou produtos variados envasados em garrafas
plásticas, imagina-se um prazo, entre
seis a dez anos, para serem banidas,
suas perniciosas embalagens, do comércio. Certamente ninguém imagina andar para trás. O governo quer
ver a evolução das nocivas embalagens por formas menos agressivas ao
meio ambiente.
O único plástico verdadeiramente
amigo da natureza está chegando ao
mercado. Derivados do amido da
mandioca, da celulose de eucalipto ou
do etanol, os novos materiais biodegradáveis acenam com excelentes
perspectivas. Mas a nova tecnologia
precisa de apoio, pois o lobby da indústria do petróleo, que sustenta o
plástico atual, é fortíssimo. E, quase
sempre, disfarçado.
Oxibiodegradável se chama sua
roupa de Carnaval, vestida qual fantasia para iludir o povo. Acrescido de
componentes químicos tóxicos -catalisadores à base de cádmio e chumbo, entre outros-, o plástico tradicional se esfarela no ambiente, desaparecendo ao olho nu. Parece bom, mas
esconde um perigo, conforme alertam os especialistas.
Curiosa mesmo, porém, é a idéia do
deputado estadual Sebastião Almeida
(PT), que deseja tornar obrigatório
-repito, obrigatório- o uso desse
controverso plástico. A indústria,
multinacional, que fabrica o plástico
oxibiodegradável adorou. Evidentemente, recomendei ao governador o
veto ao projeto de lei. Divulguei a posição do governo em artigo nesta Folha. Inconformado, o parlamentar esbravejou contra mim. Impingiu-me
uma ação popular. A empresa ameaçou me processar. Defendi-me juridicamente. Haja paciência.
Baltasar Gracián dizia que o homem prudente transforma a ojeriza
em espelho. Chega de confronto. A
Secretaria Estadual do Meio Ambiente vai investir fortemente em educação ambiental. Para que, consciente, a
população saiba discernir, ela própria, sobre seu futuro. Melhor dizendo, sobre o futuro da civilização.
Sem
engodo plástico.
FRANCISCO GRAZIANO NETO, o Xico Graziano, engenheiro agrônomo, é secretário estadual do Meio Ambiente
de São Paulo. Foi presidente do Incra (1995), secretário de
Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (governo Covas) e chefe do gabinete pessoal da Presidência
da República (gestão FHC).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Marco Antonio Raupp, Jacob Palis Jr. e Luiz Eugênio Araújo de Moraes Mello: Portal da Capes é modelo de acesso à ciência Próximo Texto: Painel do Leitor Índice
|