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Por que a BrOi tem pressa ?
RUBENS GLASBERG
A questão principal é: qual o interesse público atendido com a incorporação? Não há ameaça imediata causada por espanhóis e mexicanos
A PETROBRAS, a megaempresa
de petróleo considerada estratégica para o Brasil, foi criada
por lei aprovada no Congresso após
memorável campanha popular. Não
foram um decreto presidencial e muito menos a decisão de alguma autarquia que legitimaram o modelo de política nacional de petróleo vigente até
hoje. A sociedade não foi informada
na época, como o é agora no caso da
criação de uma megaempresa brasileira de telecomunicações, por meio
de reportagens em off, seguidas de
notas oficiais desencontradas e balões de ensaio sem paternidade plantados em jornais e revistas.
Dada por alguns órgãos de imprensa como fato consumado (que não
vem se consumando há várias semanas), a compra da Brasil Telecom pela
Oi, para criar a BrOi, é uma operação
que pressupõe uma mudança no modelo de telecomunicações estabelecido há dez anos. Em lugar das três concessionárias fixas atuais, seriam apenas duas, mais a Embratel como concessionária na longa distância. Há dez
anos, para se estabelecer o modelo
atual, foi feita uma lei, criou-se uma
agência, a proposta foi colocada claramente para a sociedade, e tudo isso
passou pelo Congresso. Agora, o modelo está sendo montado em uma discussão fechada, em função de interesses imediatos de sócios que querem
vender suas participações, sócios que
querem ampliar suas participações,
além do Opportunity, acusado na
Justiça brasileira e norte-americana
de tungar os próprios sócios e as empresas que administrou por sete anos.
Para liberar a fusão de Oi e Brasil
Telecom, seria necessário mudar o
Plano Geral de Outorgas, permitindo
que um mesmo grupo controle duas
concessionárias. A diferença entre
um modelo com duas empresas e um
com três é significativa, porque a BrOi
teria uma área de atuação muito ampla, sendo a responsável pelo atendimento de quase 78% da população.
Ainda que o mercado não esteja se
concentrando diretamente por meio
dessa fusão, já que as duas não concorrem, elas passam a ter uma responsabilidade muito maior e, em caso
de problemas, o impacto será muito
mais significativo.
Acontece que o novo modelo só será isonômico (ou seja, não-casuístico)
se permitir também que outras concessionárias se consolidem. E se a Telefônica e a Embratel resolverem se
consolidar, em cenário hipotético?
Qual será o argumento do governo
para não permitir? E o mercado de telefonia celular, que hoje também é dividido pela regra de que um mesmo
grupo não controla duas ou mais operações em uma mesma área? Se mudou o PGO, por que não mudar as regras da telefonia celular? Será difícil
encontrar explicação para essas situações. Não por acaso, Telefônica e
Embratel estão caladas. Será que esperam alguma benesse também?
Mas o mais grave é o argumento de
que se está criando uma grande empresa nacional, que servirá de contrapeso aos dois gigantes internacionais
que atuam no Brasil: Telefônica e Telmex/América Móvil. A garantia de
que a BrOi será nacional será um mero acordo de acionistas. O BNDES e os
fundos de pensão das estatais, em tese, são os garantidores dos interesses
nacionais. Mas acordo de acionistas
muda-se a qualquer hora, basta que os
acionistas o queiram. E pior, cabe aos
fundos e ao BNDES financiarem a
operação e os acionistas, em uma engenharia maluca em que o negócio só
será bom para o BNDES se a megatele
der certo. E quem garante?
Sem diminuir a relevância dos problemas e vontades dos sócios controladores, a questão principal que se coloca é: qual o interesse público atendido com a incorporação da Brasil Telecom pela Oi? Não há ameaça imediata
causada por espanhóis e mexicanos.
Os resultados de balanço de Oi e BrT
são muito bons. Por que a pressa?
Um fato é inegável: passados dez
anos, o modelo do ministro Sérgio
Motta, que promoveu um fantástico
desenvolvimento das telecomunicações, começa a implodir. Baseado no
binômio competição/universalização
da telefonia convencional, o projeto
não é mais adequado ao mundo da
tecnologia IP e da convergência. O
modelo de negócios da telefonia baseado na tarifação diretamente proporcional ao tempo de uso e à distância da ligação está morrendo. O que se
vende hoje é banda. A disputa é pelo
acesso em banda larga tanto por fio
quanto sem fio (wireless). E mais: há
uma crescente interpenetração dos
serviços fixos e móveis. Deixaram de
existir áreas estanques como fixo,
móvel ou longa distância, sobre as
quais se fundamenta toda a regulamentação atual. É preciso rediscutir o
modelo, como já o fizeram vários países. Não será a mera fusão ou incorporação BrOi que resolverá questões básicas. A discussão tem que ser pública
e no interesse público.
RUBENS GLASBERG, 64, é jornalista da revista especializada em telecomunicações "Teletime".
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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