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CLÓVIS ROSSI
O retrovisor embaçado
SÃO PAULO - Do ministro do Trabalho, Carlos Lupi, em artigo para
esta Folha, publicado no domingo:
"A crise vai ficando para trás, sendo
vista apenas pelo retrovisor do
mercado".
Da vida real, apenas quatro dias
depois: o Brasil perdeu 101.748 vagas com carteira assinada em janeiro, no pior resultado para esse mês
em dez anos. Da vida real, cinco
dias depois: em apenas um mês, foram contabilizados mais 323 mil
desempregados nas seis principais
regiões metropolitanas do país,
contabiliza o IBGE.
Do gerente da pesquisa IBGE, Cimar Azeredo: "Nem na época da recessão de 2003 houve um aumento
no número de desocupados dessa
magnitude. Foi um janeiro diferente, mais cruel, sem dúvida".
Como é que alguém pode confiar
na palavra de uma autoridade se os
fatos a desmentem tão cruelmente
dias depois?
Se Lupi fosse economista, ainda
vá lá. Economistas habituaram-se a
chutar números impunemente,
tanto que já reapareceram os "palpiteiros" depois de um curtíssimo
período em que ficaram como cachorro que caiu do caminhão de
mudança em razão da crise.
Palpiteiros, otimistas como Lupi,
ou profetas do apocalipse não têm
base para o que estão dizendo, porque ninguém sabe direito o que está acontecendo nas entranhas do
sistema financeiro nem, por extensão, os desdobramentos que a crise
terá. Mas é forçoso admitir que a
tribo dos catastrofistas tem tido
muito mais motivos para anabolizar suas certezas, porque há muito
mais más notícias.
Vide o caso Embraer: 90% de
suas encomendas vêm do exterior.
Crise no mundo, crise nas encomendas, mas demissões, acima de
tudo, no Brasil, país em que está a
maior parte da produção.
Será que o ministro Lupi teria coragem de ir à Embraer para contar
aos demitidos que a crise está sendo vista apenas pelo retrovisor?
crossi@uol.com.br
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