São Paulo, terça-feira, 21 de março de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PLÍNIO FRAGA

Mergulho do Brasil

RIO DE JANEIRO - O falcão é uma ave que se caracteriza por atacar os inimigos em vôo, alcançando velocidade de quase 300 km/h em seu mergulho. O choque que a presa leva ao ser atingida por suas garras no ar é tão forte que geralmente leva à morte imediata. O falcão está associado à violência, por sua natureza e pela natureza dos homens.
Nos Estados Unidos, falcão é a designação dada a assessores linha-dura do presidente do George W. Bush. São defensores das ações de guerra no combate ao "eixo do mal".
A exibição na TV anteontem do documentário "Falcão - Meninos do Tráfico" expôs mais uma vertente: a do falcão como vigias de traficantes, que não dormem e vivem à espera do combate com "os alemão", sejam traficantes rivais ou efetivos policiais.
Além do falcão, apresenta-se a público o "fiel", uma espécie de traficante tutor de crianças em iniciação no mundo das drogas.
É aterrorizante ver um grupo de jovens e adolescentes simulando o assassinato de um traidor (x-9) ou trabalhando em conjunto para embalar maconha em um barraco e narrando como é viver para o "movimento", ou para a "firma", como afirmam.
"Se morrer, vou descansar. Há muito esculacho na vida", diz um menino aparentando dez anos, falcão do tráfico. "Aqui a gente vive a realidade. Onde a bala come, a lei é do cão", conta outro.
O rapper carioca MV Bill e seu empresário, Celso Athayde, ao longo de seis anos, filmaram falcões em favelas de vários Estados. Dos 17 personagens centrais, 16 foram assassinados e tiveram seus enterros registrados.
O falcão que resta vivo tem uma declaração incluída no livro de mesmo nome que está sendo lançado na carona da exibição do documentário: "Meu sonho é ser palhaço. Quando eu fizer 18 anos, vou largar esse fuzil e procurar um circo", diz ele. Não deu tempo -o único vivo hoje está preso.
Os falcões são o símbolo de um país que, contraditoriamente, não alçou vôo, mas já está em queda livre, num mergulho meteórico, como fazem as aves de rapina.


Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Quanto mais demora, pior
Próximo Texto: Roberto Mangabeira Unger: O que levantaria o Brasil?
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.