São Paulo, quarta-feira, 21 de abril de 2004

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ANTONIO DELFIM NETTO

Alca-México-Nafta

A experiência mostra que os fatores mais importantes para a atração do investimento estrangeiro são 1º) o tamanho do mercado e 2º) a sua taxa de crescimento. Quando o tamanho do mercado é capaz de suportar uma escala de produção razoável, ainda que num nível não internacionalmente competitivo, mas há algum impedimento para as importações (tarifas, cotas, similar nacional etc.), a decisão da multinacional é instalar-se no país para aproveitar e reservar o mercado interno. Se o impedimento administrativo subsiste, ela usa o poder de monopólio que ele dá às empresas aí instaladas e não lhe ocorre nenhum estímulo exportador. Há claras vantagens e desvantagens (para o país e para a multinacional) em tal procedimento quando comparado ao mundo ideal de absoluta liberdade de comércio e pleno emprego. O problema é que não há nenhuma garantia de que esse regime produza o pleno emprego. Um dos efeitos mais perniciosos da acumulação dessas situações é que ela reduz a taxa de câmbio real, prejudicando as exportações.
Quando, além do mercado interno, o país oferece, ainda, robustas taxas de crescimento, eleva-se o horizonte de lucro e estimula-se a ampliação da escala de produção para torná-la internacionalmente competitiva. Entra-se num regime de maior complementaridade produtiva, em que o comércio intrafirmas adquire nova dimensão. É isso que torna possível a criação de "vantagens comparativas". A agenda positiva do Estado interage com a multinacional, oferecendo-lhe hospitalidade e simpatia para capturar um pedaço da sua produção mundial com a construção de uma base exportadora dentro do país. A multinacional internaliza sua produção exportável porque o ambiente a acolhe com garantia de bons lucros dentro de regras estáveis.
É por isso que temos hoje tão pouco interesse das multinacionais para instalarem aqui suas bases de exportação. Desde 1990, recusamo-nos ao "diálogo construtivo". Adotando a idéia de "quem quiser vir que venha pela mão do deus-mercado", o Brasil perdeu todo o seu "charme". Vendemos às pressas o patrimônio nacional no setor produtor de serviços (logo, não-transacionáveis) oferecendo aos compradores crédito com a poupança nacional e dando-lhes ainda condições de lucro extremamente favoráveis (como a correção tarifária pelo IGP-DI, que superestima o deflator implícito, como se sabe desde os anos 50). Temos muito mais serviços, a preços muito maiores, sem ter feito nada para resolver o problema das exportações. E nunca mais recebemos investimentos produtivos...
Assistimos agora a um movimento perturbador. Enquanto os governos discutem o problema da Alca, grandes empresários nacionais exploram concretamente a construção de base exportadora para os EUA no México. Tornam, assim, irrelevante a laboriosa decisão do governo brasileiro e previnem-se de um fracasso nas negociações. O Brasil, entretanto, perde exportações e vê agravar-se a sua imensa dependência externa. É hora de levar esse problema a sério!


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

dep.delfimnetto@camara.gov.br


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