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RUY CASTRO
Dilma, vida e obra
RIO DE JANEIRO - Quando se
trata de escrever uma biografia, há
duas maneiras de fazer o serviço:
deixar que a vida ilumine a obra do
sujeito ou vice-versa. Na verdade,
só os livros que se baseiam na vida
de uma pessoa podem ser chamados de biografias. Os que privilegiam a obra como um meio de se
chegar à vida são, mais precisamente, ensaios biográficos.
Só acredito na primeira opção
-entre outras coisas, porque nem
sempre a obra reflete a vida de alguém. Já um mergulho na vida desta pessoa poderá revelar inclusive a
possibilidade de ela estar tentando
se esconder em sua obra.
Uma bela caixa com oito CDs, "Os
Anos Dourados de Dolores Duran",
organizada por Rodrigo Faour e recém-lançada, prova isso. A suave
melancolia que atravessa a obra de
Dolores como cantora e compositora fez com que os pósteros a vissem
como uma mulher triste e solitária
na vida real. Pois nada menos verdadeiro. Ela era alegre e vivaz, cheia
de amigos e namorados. Morreu em
1959, aos 29 anos, porque tinha um
problema congênito no coração
-para o qual não dava bola.
O mesmo para quem se propõe a
descrever escritores como Lucio
Cardoso e Otto Lara Resende a partir de seus romances. O Lucio boêmio, festeiro e gregário não se confundia com seus personagens sexualmente atormentados, assim
como Otto, pragmático, cético e frasista, também não parecia corroído
por dúvidas religiosas mortais.
Tudo isso é para advertir os biógrafos de Dilma Rousseff, que não
demorarão a pulular. Em sua obra
pré-eleitoral, ela às vezes é Norma
Bengell; em outras, Nelson Mandela. De manhã, é católica; à tarde,
evangélica; à noite, macumbeira.
Seu currículo inclui diplomas e créditos de faculdades que não frequentou. Tudo que diz lhe é soprado ao ouvido. Qual é a vida, qual é a
obra? Hoje nem Dilma deve saber.
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