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Editoriais
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Jovens velhos
Eleição direta para a presidência da UNE poderia rejuvenescer entidade aparelhada
por facções políticas
DIRETAS-JÁ : a palavra de
ordem conta a esta altura com 25 anos de
existência. Guarda
consigo o sabor de um tempo em
que as reivindicações da sociedade, ainda que provisoriamente
negadas, não desaguavam em desesperança e ceticismo.
O lema ressurgiu estampado
na camiseta de Augusto Chagas,
aluno da USP, entrevistado pela
Folha na edição de ontem. Com
27 anos de idade, o líder universitário -que acaba de ser eleito
presidente da União Nacional
dos Estudantes- sem dúvida
não terá lembranças do processo
de redemocratização do país.
Não carece, todavia, de combatividade de espírito. Quer uma
reforma universitária e a regulamentação da meia-entrada.
Filiado ao PC do B, partido que
controla a entidade há 18 anos,
Chagas foi eleito por 2.809 votos,
num congresso que supostamente representaria 5 milhões
de universitários.
A incoerência da situação é reconhecida pelo líder estudantil.
Viria em boa hora, por certo, a
adoção do voto direto para a presidência da UNE.
Mesmo no período anterior à
ditadura, a entidade servia mais
aos interesses dos partidos de esquerda do que à vaga maioria dos
estudantes que estava encarregada de representar.
Reconheça-se, entretanto, que
os tempos eram outros: os universitários brasileiros em 1964
faziam parte de uma elite. Hoje,
entre os 5 milhões de estudantes
que frequentam faculdades em
todo o país, não será exagero intuir que um projeto particular de
ascensão social predomine, comparado às mobilizações cívicas
de antigamente.
Com isso, a UNE se isola do
ponto de vista político. De modo
semelhante, também se isolam
politicamente aqueles cidadãos
que se indignam diante dos desmandos do Congresso e do Executivo. É como se a grande maioria dos brasileiros se voltasse para si mesma, para a esfera de seus
interesses privados, de suas prioridades pessoais.
Bom sinal: eis que cada indivíduo se mostra menos dependente das chuvas e trovoadas que lhe
adviriam de um governo errático
e convulso. Mau sinal, contudo, à
medida que a indiferença prática
dos cidadãos termina por autorizar, implicitamente, o aparelhamento do Estado.
Máquinas políticas, pouco importa se de direita ou de esquerda, apropriam-se da burocracia
governamental para cuidar de
seus negócios. A UNE, a Petrobras, as centrais sindicais -ícones dos movimentos coletivos
pré-64- hoje se resumem, tristemente, ao que na verdade foram desde sempre: aparelhos a
serviço de facções organizadas.
Mas o contexto não é o mesmo.
As ideologias de 40 anos atrás refletiam, bem ou mal, as aspirações de uma classe média em
conflito com um país atrasado,
agrário e bacharelesco.
Hoje, o atraso mudou de nome,
endereço e classe social. A UNE
se preocupa com carteirinhas e
com a participação do capital estrangeiro nas universidades privadas. No país de Sarney e de Lula, a liderança estudantil poderia
ser um pouco menos velha do
que isso. Ao menos para variar.
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