São Paulo, segunda-feira, 21 de agosto de 2000 |
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RAUL WASSERMANN Livro didático descentralizado
A defesa da política de descentralização da merenda escolar, evidenciando especialmente a virtude de o
processo permitir um controle eficaz,
diminuindo sobremaneira os casos de
corrupção, tem sido feita de forma extraordinária pelo ministro da Educação,
Paulo Renato Souza. Além das vantagens de transparência e de diminuição
da corrupção apontadas pelo ministro,
essa política representa um forte incentivo às economias locais, pois os recursos são enviados aos municípios e ali
circulam por algum tempo, constituindo importante fator na geração de empregos, criando, consequentemente,
pequenos mercados locais.
Sem dúvida, a avaliação dos livros didáticos é um processo necessário e positivo, constituindo hoje um dos principais avanços da atual gestão do Ministério da Educação. No entanto, o processo de descentralização em nada o afetaria, como não é afetada a qualidade da merenda escolar comprada de forma descentralizada. Não se deve esquecer que a questão central é a qualificação do professor, sendo ela o motor da melhoria da qualidade dos livros didáticos. O fato é que, atualmente, o custo do livro didático, divulgado pelo Ministério da Educação, não está acrescido das despesas de distribuição, promovida diligentemente pelos Correios, nem das da máquina burocrática exigida para organizar essa verdadeira operação de guerra que é centralizar em Brasília a compra de milhões de livros para os mais de 6.000 municípios espalhados por 8,5 milhões de km2. O Ministério da Educação, ao negociar com as editoras, considera tão-somente os gastos diretos de impressão e os direitos autorais, acrescentando uma "margem" arbitrária como "lucro" das editoras, o que as obriga a repassar os custos reais para os livros vendidos aos alunos das escolas particulares. Ou seja, a classe média com filhos nas escolas particulares é que paga indiretamente uma parte do custo dos livros dos alunos da rede pública. Ao fazer a compra centralizada, o Ministério da Educação estrangula o desenvolvimento das livrarias locais. Essas livrarias, que teriam no livro escolar um importante momento de composição de seu capital de giro, se vêem alijadas do processo e deixam de existir. Essa política faz também com que o recebimento dos livros nas escolas se torne um momento burocrático, desprovido de significado, já que não cria o hábito de ir às livrarias, tomar contato com as novidades, de familiarização com a diversidade de livros. E tudo isso faz parte da criação do hábito da leitura. A Câmara Brasileira do Livro já apresentou ao Ministério da Educação projetos para o desenvolvimento de compras descentralizadas, envolvendo as livrarias nesse processo. Temos consciência das dificuldades para sua implementação. Sabemos que seria irresponsável mudar da noite para o dia um sistema que, apesar dos defeitos, funciona. Mas temos certeza de que o papel positivo do ministério no desenvolvimento da indústria editorial no Brasil, que temos sempre destacado, poderá ser potencializado e adquirir dimensões muito maiores de cidadania, estímulo à leitura, participação comunitária e desenvolvimento econômico no momento em que a questão da descentralização da aquisição dos livros escolares for encarada com a mesma disposição e seriedade com que estão sendo implementadas outras políticas. Raul Wassermann, 57, editor, é presidente da Câmara Brasileira do Livro. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Roberto Romano: Nós, os leigos Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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