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ELIANE CANTANHÊDE
De Brasília para o mundo
BRASÍLIA - Depois de o Brasil condenar a invasão do Iraque, chefiar o G-21 contra os países ricos e assumir a
liderança da América do Sul, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está
obrigado a fazer um discurso à altura
na abertura da Assembléia Geral da
ONU, terça-feira, em Nova York.
Nesse ajuste da ação ao discurso, ou
do gesto à palavra, espera-se que o líder Lula diga poucas e boas àquela
gente do Primeiro Mundo que ainda
considera o Brasil um "paisinho"
cheio de mendigos e bananas.
Diga, por exemplo, que não se pode
apoiar uma Alca mantendo o desequilíbrio dos Estados Unidos em relação ao resto do continente; que não é
possível negociar nada com esses subsídios agrícolas americanos e europeus; que faltam salvaguardas para
os pobres no sistema financeiro; e que
o multilateralismo tem que vencer o
unilateralismo -o bem sempre vence o mal, não é mesmo?
Se sabe o que quer e sabe o que vai
dizer, Lula poderá esbarrar em dificuldades técnicas. Só terá 15 minutos,
sem direito a improviso. Terá de se limitar ao texto escrito e, se falar sobre
jabuticabas e periquitos, ninguém
vai traduzir nem entender nada.
Enfrentará, ainda, alguns obstáculos políticos. O principal é manter o
tom contra os ricos sem parecer antiamericanismo. O segundo é defender os pobres sem atacar os ricos mais
do que o prudente -para não afugentar mercados e investidores.
De Nova York, Lula fará mais uma
viagem insossa ao México e seguirá
para uma viagem, essa sim caliente,
para a Havana do amigão Fidel Castro. Aí a questão é inversamente proporcional à do discurso na ONU.
Em vez de ler um discurso de 15 minutos previamente escrito, Lula poderá ouvir um de horas e horas feito
de improviso por Fidel -evidentemente, contra Bush e os EUA. Além
disso, seu problema vai ser não frustrar a expectativa: a platéia vai querer sangue contra os americanos.
Líder que é líder assume riscos, não
fica em cima do muro. E é justamente
aí que mora o perigo de Lula numa
viagem que começa nos EUA de Bush
e acaba na Cuba de Fidel.
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