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VINICIUS MOTA
A tônica do discurso
HÁ ALGUM tempo, meus ouvidos começaram a notar
algo estranhamente freqüente na fala de jornalistas do rádio e da TV brasileiros e na linguagem publicitária em geral. Quando
enfatizam uma palavra no discurso, acentuam o início do vocábulo.
Ai das aurículas passadistas se a vogal tradicionalmente pronunciada
com mais intensidade (a tônica) da
palavra não está alocada na primeira sílaba. O resultado é esdrúxulo.
"O governo loteou politicamente
"dêzesséte" mil cargos na administração". O hábito está tão disseminado que pode ser detectado até na
disputa presidencial. Basta prestar
atenção às falas do candidato do
PSDB ao Planalto. Quanto mais incendiada a mensagem de Geraldo
Alckmin, mais carregadas ficam as
suas primeiras sílabas.
No debate televisivo de anteontem, como o tucano estava mais
contido, mais esparsos foram seus
rompantes contra a prosódia tradicional. Mas eles ocorreram. Alckmin acusou o governo Lula de
"ômissão" na segurança pública,
prometeu trabalhar de forma "íntegráda" com os governadores de
Estado e "rêduzír" os índices de
violência no país. Quer também
um ensino médio "úniversalizádo".
Fico me perguntando qual é a
origem dessa variação no modo
clássico de falar português. Quem
se recorda da vaga de gerundismo
-"vou estar enviando um técnico
para a sua residência"- que varreu
o país há alguns anos sabe que ela
estava associada à explosão de serviços de telemarketing e às traduções descuidadas de protocolos
oriundos da língua inglesa.
O que estará por trás da síndrome do acento precoce (SAP) no
português falado nos meios de comunicação do Brasil? Fácil como
culpar o mordomo é encontrar o
vilão na língua de Byron, repleta de
palavras cujo acento recai nas sílabas iniciais. Na comparação com as
línguas latinas, as variações de tom
e volume do inglês parecem desempenhar papel mais importante
para a inteligibilidade do discurso.
Ouvir o noticiário da CNN ou da
BBC e depois passar a algum telejornal brasileiro (de preferência
com apresentadores e repórteres
mais jovens) é uma experiência interessante. De minha parte, noto
uma convergência, meramente impressionista, no ritmo das falas. O
leitor está convidado a fazer o teste
e tirar suas próprias conclusões. Os
lingüistas estão convidados a desmentir as bobagens que este leigo
acabou de escrever.
O sociólogo francês Marcel
Mauss (1872-1950), em "Les Techniques du Corps", observou que o
modo de caminhar das jovens parisienses ("a posição dos braços, as
mãos caídas enquanto se anda")
era igual ao das americanas. Eram
os filmes de Hollywood a induzir
mudanças nos hábitos corporais
mais sutis em escala global.
VINICIUS MOTA é editor de Opinião.
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