São Paulo, sábado, 21 de outubro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A publicidade infantil deve ser proibida por lei?

NÃO

Educar, sim; proibir, não

GILBERTO C. LEIFERT

HÁ UM caminho simples: proibir. Há o caminho correto: educar. Pois cidadãos responsáveis e consumidores conscientes se forjam com informação.
Até recentemente, a sociedade entendia ser a educação tarefa exclusiva de pais e professores. Sabiamente, esse conceito evoluiu. Cobra-se, agora, o compromisso de educar também de veículos de comunicação, publicidade, das artes etc. Não poderia haver reivindicação mais justa, dada a importância da educação -desde que não se esqueça o essencial: a responsabilidade de pais e professores continua sendo intransferível.
O Conar aplica o Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, que cuida da publicidade em geral e que acaba de ser atualizado e ampliado em relação aos anúncios de produtos e serviços destinados a crianças e adolescentes.
A auto-regulamentação recomenda que a publicidade seja um fator coadjuvante aos esforços de formação de crianças e adolescentes, contribuindo para o desenvolvimento positivo das relações entre pais e filhos, alunos e professores etc., sempre respeitando a ingenuidade, a inexperiência e o sentimento de lealdade dos menores.
O código recomenda ainda que os anúncios não desmereçam valores sociais ou provoquem discriminação, em particular daqueles que não sejam consumidores do produto, tampouco associem crianças e adolescentes a situações incompatíveis com sua condição, sejam elas ilegais, perigosas ou socialmente condenáveis.
Mais: a publicidade, entre outras recomendações, não deve: impor a noção de que o consumo do produto proporciona superioridade ou, na sua falta, inferioridade; provocar situação de constrangimento aos pais com o propósito de impingir o consumo; empregar crianças e adolescentes como modelos para vocalizar apelo direto, recomendação ou sugestão de uso ou consumo, tipo "peça pra mamãe comprar" ou "faça como eu, use".
Essas recomendações -e outras mais- são, para o Conar, contribuições muito mais efetivas à formação dos futuros consumidores do que a simplista proibição das mensagens.
Lembrando B. Russel: para todo problema complicado há uma solução simples, rápida, de baixo custo e... errada. O Conar acredita que proibições de publicidade de qualquer espécie vêm de uma compreensão deturpada do poder e alcance da comunicação mercadológica. Confunde-se a publicidade com o ato de consumir, como se toda pessoa exposta a ela corresse à loja mais próxima para gastar o que não tem com aquilo que não precisa ou que lhe possa causar dano.
Mesmo que o fizesse, a presunção da comunidade publicitária é que todos os produtos à disposição do público são seguros para o consumo -em especial os destinados a crianças.
Além do mais, a Constituição não admite o banimento da publicidade. Saliente-se, já existem parâmetros amplos de proteção para as crianças: o Código de Defesa do Consumidor proíbe, chegando a criminalizar, a publicidade abusiva, em cuja definição se enquadra qualquer anúncio que se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança. E o ECA prevê a intervenção do Ministério Público diante de ato ou fato que ofenda ou prejudique a incolumidade ou a formação dos menores.
Os anunciantes, agências e veículos, reunidos voluntariamente no esforço da auto-regulamentação, acreditam que, reforçando a educação para o consumo e para os hábitos saudáveis, estarão contribuindo para que crianças e adolescentes desenvolvam estrutura intelectual sólida, que lhes valerá para o resto da vida.
Por isso, o Conar reconhece a importância de projetos como o "Formando hoje o consumidor de amanhã", do Ministério da Justiça, e o "Programa de educação para o consumo", da Fundação Procon-SP, que visam formar um consumidor consciente, crítico e participativo.
Registra ainda os esforços da Escola de Aplicação da USP, para alunos de primeiro e segundo anos do ensino fundamental, com o projeto "Educando para o consumo", e, no âmbito das cidades, a introdução da matéria "Estudos básicos de direito do consumidor" no conteúdo curricular do primeiro grau, como fez São Paulo. Educar, sim. Proibir, não.


GILBERTO C. LEIFERT, bacharel em direito pela USP, é presidente do Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária). Site: www.conar.org.br


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