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JOÃO SAYAD
Manobra
errada
Antigamente, estabilidade queria dizer inflação baixa e baixo
desemprego. Nos Estados Unidos, 3%
de inflação e 4% de desemprego. Na
América Latina, inflação de 20%, sem
estatística de desemprego.
Naquele tempo, Galbraith previu
que um mundo mais próspero e rico
demandaria mais bens públicos -segurança, proteção do ambiente, educação como direito republicano etc.
Enganou-se completamente.
A prosperidade do mundo aumentou a demanda por dinheiro. Investidores só investem na construção da
fábrica nova se puderem trocar as
ações rapidamente por mais dinheiro
para fazer outro investimento que novamente será vendido. A regra do jogo
não é produzir mais bens, e sim produzir mais dinheiro, ativos financeiros líquidos.
Por isso, a partir dos anos 80, estabilidade passou a significar apenas inflação baixa. Sem dinheiro de valor estável, não há investimento. Desemprego
deixou de ser critério de estabilidade.
Passou a ser "natura" ou o necessário
para manter estabilidade de preços. O
governante "moderno" de direita ou
esquerda tem apenas um objetivo: estabilidade.
Mas a economia capitalista é sempre
instável, sujeita a ventos, chuvas e
tempestades. Ianomâmis ou esquimós nunca se preocuparam com estabilidade. Estabilidade é carência dos
trabalhadores e investidores da economia globalizada.
Por isso, há anseio generalizado por
estabilidade, pois estabilidade não há.
Nem poderia haver em economia tão
dinâmica, que desmancha tudo e cria
tantas novidades. Para cada direção
do vento que sopra na economia, existe uma ideologia que a justifica, dizendo que é natural, inexorável ou a melhor situação possível. No começo do
século passado, o Brasil tinha que ser
um país essencialmente agrícola. Agora, a ideologia afirma que basta a inflação ser baixa para haver desenvolvimento.
Para bom piloto, ideologia e ventos
não têm importância. O piloto safo leva o barco para qualquer destino com
quase todos os tipos de vento.
Velejar a favor do vento, com vento
de popa, é a pior alternativa. O barco
anda devagar e fica instável. Contra o
vento, o barco aderna, desconfortável
para marinheiro de primeira viagem,
mas anda mais e com mais estabilidade. Dando bordos, mudando a direção do barco com relação ao vento, é
possível chegar a qualquer destino.
Há três anos que a economia brasileira navega com vento de popa: superávit primário elevado e juros reais de
10%. Segue um manual ideológico sobre o qual não refletiu. Estamos andando devagar e a situação é instável
-a dívida pública não diminui apesar
do superávit, o dólar fica barato e o
crescimento é insatisfatório.
O governo quer mudar o rumo
-reduzir o superávit primário e
manter os juros. É manobra errada: a
dívida crescerá e gastos maiores por
um ano não ajuda. O próximo governo terá que voltar atrás.
A manobra certa é baixar os juros e
manter o superávit. A dívida pública
diminuiria, o dólar ficaria mais caro e
a economia cresceria mais. Deveria ter
sido feita muito antes. Agora é tarde,
vamos dar o bordo errado, pois já chegou o ano das eleições.
João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
@ - jsayad@attglobal.net
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