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MELCHIADES FILHO
Dilma e o baú da felicidade
Lula sempre teve uma relação próxima com a imprensa.
É vaidoso, gosta de aparecer e
sabe que os jornais o ajudaram a conquistar e garantir espaço político, principalmente
na reabertura democrática.
Dilma nada tem de frívola e
até a campanha manteve distância dos jornalistas, desconfiada ou mesmo convencida
de que só atrapalham, quando não representam "o inimigo".
É seu DNA brizolista.
Não é certo, porém, que, em
razão das diferenças de personalidade e trajetória, a futura
presidente atuará mais ostensivamente do que o padrinho
contra as grandes empresas de comunicação do país.
Lula deu bordoadas sucessivas na imprensa não só para
atiçar patrulhas e esvaziar denúncias, mas, sobretudo, para
reforçar a imagem de pai dos
pobres e vítima das elites. Os
vilões de outros momentos
(usineiros, banqueiros, coroneis etc.) estavam todos no governo. Sobrou para "a mídia".
Dilma não tem perfil para
replicar a estratégia. O marqueteiro da campanha não a
pintou como coitadinha. Destacou "a mulher que decide".
Outro senão é que Dilma terá de escolher meticulosamente as primeiras batalhas.
A macroeconomia e a aliança com o PMDB já prometem dor de cabeça o suficiente.
Ademais, como todo chefe
de governo em início de mandato, ela será pressionada a
produzir boas notícias. Por
que torpedear justamente
quem poderá veiculá-las?
Mas há mais uma razão para Dilma, a despeito do discurso beligerante do PT, não gastar tempo e energia contra a
radiodifusão e a grande imprensa: a ofensiva, silenciosa,
já foi feita, sob amparo da tendência de mercado.
Neste ano o governo Lula:
* acionou os fundos de pensão estatais e chancelou o
acordo que passará a portugueses a "supertele nacional";
* decidiu abrir às teles o mercado da TV a cabo;
* lançou um plano nacional
da banda larga, nas mãos de
uma estatal com R$ 15 bilhões
para escolher quem contratar;
* fechou os olhos à entrada dissimulada de capital estrangeiro na imprensa/internet;
* ampliou a publicidade em
órgãos menos independentes.
Coordenadas ou não, essas
medidas alteram a correlação
de forças na iniciativa privada
-ampliam a margem de ação
de múltis telefônicas e/ou têm
potencial para enfraquecer algumas empresas nacionais.
As teles investem por ano
no Brasil R$ 20 bilhões -oito
vezes o patrimônio total do
Grupo Silvio Santos.
A aposta no Planalto é que
vários empresários brasileiros
terão de pedir água e, em troca
de barreiras protecionistas,
aceitar, senão pedir, mudanças na lei das telecomunicações -ideia que hoje rejeitam.
Caberia a Dilma, nesse cenário, arbitrar não apenas a
nova conjuntura de mercado,
mas também o debate sobre o
"papel" da imprensa.
MELCHIADES FILHO é diretor-executivo da Sucursal de Brasília
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