São Paulo, segunda-feira, 21 de dezembro de 2009 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Otimismo dos brasileiros
ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA
OS BRASILEIROS em geral são comparativamente bem mais otimistas que seus pares da América do Sul ou da América Latina. Lembro-me de que há alguns anos, quando escrevi um artigo sobre "Essa tal felicidade", baseando-me em estudos que procuravam medir a felicidade de diferentes povos, apesar do momento difícil que o Brasil vivia na ocasião, aparecíamos muito bem na fotografia. Certamente é uma de nossas características: somos um povo alegre e quase sempre cordial. Afinal, felicidade e alegria não estão dissociadas. Nem mesmo com todas as dificuldades pelas quais todos passam ao viver em grande metrópoles, como São Paulo e Rio de Janeiro, não perdemos nossa característica de alegria e bom humor, que também considero traço importante de nossa personalidade. Almoço periodicamente no restaurante dos funcionários da SulAmérica, onde estou no Conselho de Administração, e reparo que principalmente as moças e as senhoras, quando em grupo, estão sempre conversando e sorrindo. Essas reflexões introdutórias foram motivadas por reportagem recentemente publicada por esta Folha sob o título "Otimismo cresce e puxa investimentos" (Dinheiro, 16/12). A reportagem, baseando-se em pesquisa de uma firma de auditoria e da CNI (Confederação Nacional da Indústria), indica claramente uma atitude otimista com o país em relação a 2010. Essa expectativa de comportamento está lastreada no levantamento de empresários consultados, que esperam receitas crescentes em 2010 (na casa de 14%) e dos quais 90% indicam que vão ampliar seus investimentos. Essas perspectivas positivas estariam lastreadas na Copa do Mundo, nas descobertas do pré-sal e na economia interna, que vai ser o motor desse crescimento. Numa análise que fiz dois meses atrás no Conselho Superior de Estudos Avançados da Fiesp sobre os desafios que o futuro nos reserva, fiz questão de salientar, entre os pontos positivos ali registrados com o progresso alcançado nos últimos 15 anos, o fato de a sociedade brasileira estar readquirindo seu amor próprio e sua autoconfiança. Os antropólogos costumam lembrar que o Brasil viveu um período semelhante ao que estamos experimentando durante a chamada "era JK". Convém não esquecer que o surto provocado pela construção de Brasília e outras obras de grande porte foi o responsável pelo surto inflacionário que nos perseguiu por décadas. Portanto, sob esse aspecto, o otimismo atual tem bases bem mais sólidas e, certamente, o fator determinante, na minha opinião, é que o Brasil tem uma moeda. Sem moeda, não poderíamos ter uma visão de longo prazo, o imediatismo continuaria prevalecendo e poucos se arriscariam a investir. Convivemos durante um longo período com uma série de artificialismos para combater a inflação e que, no tempo, mostraram-se problemáticos. Eram remédios que não curavam, mantinham o paciente vivo a custo de uma medicação dolorosa e que criava dependência, perpetuando a inflação. Portanto, ao final dos anos 1990, estava evidente que os brasileiros haviam esgotado sua tolerância e havia um consenso de que precisávamos recriar a confiança numa moeda. Essa percepção da sociedade, principalmente nas classes de menor renda, de que mecanismos artificiais não mais funcionavam foi essencial para estimular a busca de uma solução definitiva, que veio com o Plano Real. Com uma moeda, política econômica conservadora e melhoria nos índices sociais, a nossa imagem no exterior foi gradualmente sendo alterada, o que serviu também no processo interno de retroalimentação de maior confiança -os resultados são visíveis. Essa visão otimista não pode nos fazer deixar de enxergar os enormes desafios que temos pela frente, como a questão da educação, a reforma política, a sustentabilidade (discutida em Copenhague), o aumento da produtividade, a ampliação da taxa de poupança, o incentivo à economia do conhecimento e cuidar das reformas incompletas. Olhemos, sim, o futuro com otimismo construtivo e aproveitemos 2010 para fazer as escolhas certas. ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA, 75, economista, é sócio-fundador da Prospectiva - Consultoria Brasileira de Assuntos Internacionais. Foi o primeiro presidente da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), um dos fundadores do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) e presidiu o Conselho de Empresários da América Latina. Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES André Singer: O PT deveria conversar com Ciro Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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