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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Quem tem medo de Chávez?
SÃO PAULO - Hugo Chávez é a bola da vez. Para o bem e para o mal,
ele é a novidade ruidosa da política
latino-americana. Lula é acomodador, a ponto de se referir ao "companheiro Bush". Chávez é do enfrentamento: usou a homenagem
que lhe fez a Assembléia do Rio para
atacar a mídia brasileira, "imperialista, inimiga do povo". O lúmpen
do brizolismo que o assistia e incensava reviveu minutos de glória.
O poder autocrático acentuado
pelo Congresso servil, o traço personalista, o cerco à mídia que ainda
lhe faz oposição, o anúncio das estatizações de setores estratégicos
-tudo isso, somado à retórica do
"socialismo bolivariano", compõe a
imagem de um líder anacrônico,
um personagem de Glauber Rocha.
Chávez não é, como ele mesmo
brincou, "uma florzinha", mas o antichavismo em curso não parece
menos caricato e regressivo. Há
muita incompreensão, há exageros
"antibolivarianos" e há, em certos
casos, uma histeria que sugere a
reedição do CCC -sempre em nome da democracia. Mais uma vez, a
omissão e o silêncio táticos da esquerda democrática abrem caminho para a direita furibunda.
O socialismo do século 21 vendido por Chávez não é socialismo
nem na China -é uma reedição do
nacionalismo estatizante que deu
as cartas nas economias latino-americanas em meados do século
20. A diferença agora está, como
disse o sociólogo Demétrio Magnoli
em artigo ontem no "Estado de S.
Paulo", na nova vocação estratégica
das estatais: funcionam como "vacas leiteiras" das políticas externa e
social, distribuindo riqueza (ou esmolas), e não mais como instrumento de diversificação industrial.
Há muitas razões para supor que
a epopéia bolivariana não vai acabar
bem. Mas Chávez e seus discípulos
-a Bolívia de Evo Morales e o
Equador de Rafael Correa- não são
como raio em dia de céu azul; são
resultado de décadas de espoliação
e de receitas liberais patrocinadas
por elites que sempre deixaram os
índios da terra a ver navios.
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