São Paulo, terça-feira, 22 de janeiro de 2008

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Razão e preconceito

ENVIESADA e precipitada: é o mínimo que se deve dizer da nota de repúdio de uma centena de psicólogos, advogados, antropólogos e educadores contra estudo biológico sobre comportamento violento de 50 jovens infratores no Rio Grande do Sul. O projeto nem foi submetido a um comitê de ética em pesquisa, mas os signatários já lhe atribuem "velhas práticas de exclusão e de extermínio" e "retrógradas práticas eugenistas".
O grupo da PUC-RS e da UFRGS planeja comparar jovens sob custódia do Estado que cometeram homicídios antes dos 18 anos com outros sem registro de violência. Entram na comparação histórico familiar e educacional, psicodiagnóstico, imagens do funcionamento do cérebro e variações genéticas, entre outros aspectos.
O protocolo da pesquisa prevê obtenção de consentimento dos jovens estudados, de familiares e até do Poder Judiciário. Nada garante que identifique correlações significativas. Excluí-las de antemão, contudo, só ocorre a quem nega a priori que eventos cerebrais sejam relevantes para explicar o comportamento. A um determinismo biológico opõem outro, o do ambiente social.
A censura é uma reação estereotipada à associação de biologia com comportamento. No século 19 e no início do 20, de fato, a suposição atabalhoada de uma relação causal entre características físicas (inclusive "raça") e capacidade mental, sem base real, produziu monstruosidades. Essa pseudociência foi demolida com argumentos teóricos e resultados empíricos, como convém. Não é o que se observa agora.
Nas "Regras para a Direção do Espírito", Descartes alertava já em 1628 que prevenção e precipitação são as grandes fontes do erro. Ao estigmatizar o estudo com noções preconcebidas, os autores da nota advogam proibição incompatível com a busca do conhecimento.


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