São Paulo, quarta-feira, 22 de fevereiro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O fim da roubalheira

ANTONIO CARLOS MAGALHÃES

A cúpula do partido não gostou e até -em tom que me pareceu mais simples bravata do que outra coisa- anunciou que vai processar criminalmente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso por ele ter dito à revista "IstoÉ" e, com outras palavras, ter repetido no programa "Roda Vida", da TV Cultura, que a ética do Partido dos Trabalhadores é a ética da roubalheira.


Inacreditável que o atual presidente da República ainda tenha coragem de levantar a bandeira da ética


É compreensível essa reação -de falsa indignação- do PT. A verdade, às vezes, dói. Sobretudo quando dita como foi e como deve ser dita, sem eufemismos nem subterfúgios.
O que o ex-presidente disse não constitui novidade para nenhum brasileiro. Trata-se de verdade de domínio público, o que certamente seus advogados demonstrarão, nos termos do parágrafo 3º do art. 138 do Código Penal, caso a ameaça do processo criminal se concretize -do que duvido muito.
O certo é que, em seus 117 anos de República, o Brasil jamais passou por momento de degenerescência moral similar ao que o PT e seus áulicos lhe impuseram desde que estão no governo.
Para mim, no entanto, tão grave quanto a roubalheira a que o ex-presidente se referiu é a maneira como se tem procurado impedir as investigações e proteger os responsáveis por ela.
Agindo assim, o presidente da República protege os corruptos e faz perdurar a corrupção. De um lado, ele afirmou à imprensa querer apurar tudo, ver punidos os responsáveis e, se preciso, cortar na própria carne. De outro lado, na contramão do que deseja a sociedade, sem cerimônia e de forma desesperada, o governo tentou, inicialmente, evitar a instalação das CPIs, e, ainda hoje, tenta esvaziá-las de qualquer maneira, para isso recorrendo até a expedientes antiéticos.
São ações deletérias, embora inúteis, pois levaremos as investigações até o fim, identificando os autores materiais e intelectuais da roubalheira.
Inacreditável que o presidente da República ainda tenha coragem de levantar a bandeira da ética -ética que ele desprezou e despreza- e seja capaz de ignorar que seu período de governo é tido como o mais antiético e corrupto da história do Brasil.
Eu já disse e repito que, quem quer que seja o candidato das oposições nas eleições presidenciais de outubro, terá que colocar entre as principais promessas de campanha o compromisso de reconstruir moralmente o país. Esse é o pressuposto básico para que o povo, superada a desastrosa e frustrante experiência petista, volte a acreditar no Brasil, nos homens que tentam construí-lo e em suas instituições.
Em condições normais, nenhum candidato a cargo eletivo, muito menos à Presidência da República, teria necessidade de sair por aí apresentando atestado de bons antecedentes criminais e prometendo um governo de honestidade e austeridade -duas virtudes que, a princípio, se supõe intrínsecas ao caráter de um postulante a qualquer cargo público.
Todavia, depois do péssimo exemplo do Partido dos Trabalhadores e de seus aliados, nenhum candidato poderá chegar ao palanque e apenas prometer que, se eleito, pretende combater a fome, reduzir as taxas de juros, aumentar as oportunidades de emprego, conter a violência ou promover uma reforma agrária de verdade.
O candidato das oposições, que não deve demorar a apresentar-se à nação, terá que assumir o compromisso de enfrentar e superar esses e outros desafios que o PT e seus aliados até aqui só fizeram, despudoradamente, empurrar com a barriga farta.
Mas esse candidato precisa, mais que prometer, demonstrar ao cidadão que a era da roubalheira institucionalizada, que toda a sociedade conhece e rejeita, termina em 31 de dezembro, com o fim melancólico do mandato equivocado do senhor Luiz Inácio Lula da Silva e o início de um novo governo, que restitua ao país a dignidade arranhada.

Antonio Carlos Magalhães, 78, é senador pelo PFL-BA e presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal. Foi presidente da Casa (97-99 e 99-2001), governador da Bahia (91-94) e ministro das Comunicações (governo Sarney).


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