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Brasília é inocente
JOSIAS DE SOUZA
São Paulo - Sempre se pôs a culpa
em Brasília. O regime do "separa aí os
meus 15%" teria começado com a chegada das máquinas das grandes empreiteiras ao cerrado.
Sempre se disse que aquela ilha, rodeada por coisa nenhuma, daria errado. Era como se Brasília convidasse ao
delito.
A ausência de multidões seria um estímulo à "propinocracia". Não haveria
quem gritasse "pega ladrão". A falta
de esquinas facilitaria a fuga.
Collor reforçou o estereótipo. Era como que um filho de Brasília. Passara a
adolescência na cidade. Tivera os
olhos vazados por aquele excesso de
luz; as narinas invadidas por aquele
ar seco. Enlouquecera.
Chegou à Presidência com a ilusão
de que presidiria. Não conseguiu administrar nem a própria loucura.
Descobre-se agora que Brasília é
aqui. Ou, por outra, descobre-se que,
sob o olhar plácido de Malufs e Pittas
também vicejam Garibs e Viscomes.
Não demora e perceberemos, finalmente, que o problema não está na
Brasília de Niemeyer, mas na Brasília
que trazemos enterrada dentro de nós
mesmos.
Segundo o Datafolha, 72% dos paulistanos não lembram em quem votaram para vereador. Ainda que tenham ajudado a eleger um ladrão, o
estilo Brasília de vida os impede de
expiar a própria culpa.
Ao admitir que molhou a mão de fiscais da prefeitura, o presidente da Enterpa revelou o seu lado Brasília. Sem
corruptor não haveria corrupto.
O médico que faz ao cliente aquela
fatídica pergunta -"com recibo ou
sem recibo?"- não está senão trazendo à tona o seu jeitão Brasília. E como
se dissesse: "Sonego imposto. E quem
me ajuda a sonegar paga menos".
Brasília é um modo de vida. Pode ser
encontrado em qualquer lugar, às
margens do Paranoá ou do Tietê, no
Brasil ou nas Ilhas Fiji.
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