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Maldição do partido único
A ÁFRICA do Sul, democracia
mais pujante do continente, elege hoje seu terceiro
presidente após o fim do apartheid. Tudo indica que o Congresso Nacional Africano, o partido de Nelson Mandela, manterá intacta a hegemonia que assegura desde o início do regime
multirracial, em 1994.
Jacob Zuma, que foi companheiro de Mandela na prisão e
chefiou o serviço de inteligência
do CNA, será o provável vitorioso. No modelo sul-africano, o
eleitor vota em listas fechadas,
elaboradas pelos partidos, e assim define o Congresso, o qual
por sua vez elege o presidente.
Apesar dos avanços econômicos e sociais ocorridos no governo do CNA, os efeitos colaterais
de 15 anos de mando -período
prestes a ser estendido por mais
cinco- começam a ter peso importante na balança. O próprio
Zuma, acusado de ter recebido
propina sistematicamente, ficou
livre dos processos numa manobra que abalou a credibilidade do
Ministério Público sul-africano.
O episódio reforça a percepção
de que o aparelhamento do Estado se espraia, num país conhecido por suas instituições relativamente fortes e autônomas. Outro passivo do CNA está na saúde
pública. Durante anos seus líderes negaram o vínculo entre HIV
e Aids, enquanto a epidemia se
alastrava e reduzia a expectativa
de vida do sul-africano -de 64
anos, em 1994, para 49, hoje.
A África do Sul, no entanto, é o
único país a ostentar uma rede
de proteção social no continente,
por conta de programas deslanchados nos últimos 15 anos. Políticas assistenciais de transferência de dinheiro, semelhantes ao
Bolsa Família, atingem um habitante em cada grupo de quatro. A
economia, que se expandiu 4,7%
ao ano, em média, na última
meia década, também explica o
forte apoio popular ao CNA.
Mas eis que surge, neste pleito,
uma novidade interessante.
Uma dissidência do partido de
Mandela, chamada Congresso
do Povo, começa a quebrar o monopólio do CNA como representante de um país com 79% de negros na população.
As pesquisas não conferem ao
Cope, liderado pelo bispo metodista Mvune Dandala, mais de
15% das intenções de voto. Mas
nasce, sem dúvida, uma força capaz de oxigenar a democracia da
África do Sul -e, quem sabe, livrá-la no futuro da maldição do
governo de partido único.
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