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Belo Monte
Resultado do leilão da hidrelétrica aumenta incertezas sobre a obra, que terá perfil mais estatal do que se previa
EO GOVERNO fez Belo Monte, como queria Lula. Ou
melhor, fez o leilão da
maior hidrelétrica do
país depois de Itaipu. A construção da usina no Xingu, rio que
simboliza toda uma política indigenista pacificadora, prossegue
mergulhada em dúvidas -do
campo jurídico ao socioambiental e da engenharia às finanças.
Venceu um consórcio montado na reta final, Norte Energia. O
Planalto fez de tudo para ter esse
segundo concorrente e manter o
leilão, depois de empreiteiras peso-pesado, como Odebrecht e
Camargo Corrêa, desistirem da
licitação. Tamanho afinco para
contratar uma obra de no mínimo R$ 19 bilhões, em final do governo, só se explica pelos dividendos esperados na campanha
presidencial continuísta.
Quando já se dava como certa a
vitória do consórcio Belo Monte
Energia e dos não menos gigantes Andrade Gutierrez, Vale e
Companhia Brasileira de Alumínio, a aliança improvisada pela
construtora Queiroz Galvão e
pelo grupo Bertin ofertou R$ 78
por megawatt-hora. Com os 6%
de deságio sobre o teto do edital,
R$ 83/MWh, surpreendeu e ganhou. No mesmo dia, contudo, a
construtora deu sinais de que
abandonaria o consórcio.
O vaivém societário só faz engrossar o manancial de incertezas que circunda Belo Monte.
Ministério Público, Justiça, povos indígenas que se julgam afetados e organizações que os defendem não parecem inclinados
a dar trégua para a hidrelétrica,
controversa há três décadas.
A desistência das empreiteiras
Odebrecht e Camargo Corrêa,
maiores conhecedoras do projeto, permite supor que a obra física pode enfrentar percalços e
custos aumentados.
Por exemplo, na escavação de
dois canais de 35 km de extensão
e 500 m de largura. Como o preço da energia ofertado é similar
aos das usinas menos complexas
do rio Madeira (Santo Antônio e
Jirau), há quem desconfie que
não será suficiente para remunerar empreendedores.
No caso do Madeira, os vencedores contam com o bônus da
venda de até 30% da energia no
mercado livre, onde os preços
podem alcançar cifras muito superiores. No caso de Belo Monte,
apenas 10% a 20% da geração poderão ser assim comercializados.
Calcula-se que a usina gerará
apenas 40% da capacidade instalada de 11.200 MW.
Parece previsível que eventuais rombos na rentabilidade
terminem cobertos com subsídios governamentais. Somando-se as condições favoráveis de financiamento pelo BNDES, a
participação crescente de empresas do grupo Eletrobras e a
provável adesão ao consórcio de
fundos de pensão, tem-se que o
empreendimento Belo Monte
será muito mais estatal do que
fez parecer o leilão encomendado por Lula para reforçar a campanha de Dilma Rousseff.
Em que pesem as dúvidas e incertezas, é preciso reconhecer
que houve avanços no projeto
Belo Monte. Quando ainda se
chamava Cararaô, nos anos 1980,
inundaria área três vezes maior,
afetaria terras indígenas diretamente e viria acompanhado de
várias outras usinas no Xingu. O
projeto mudou e boa parte das
objeções foi removida.
Belo Monte está longe de ser
perfeita, mas será construída.
Quando, ou a que preço, para o
contribuinte e para a região, ainda está por se saber.
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