São Paulo, quarta-feira, 22 de junho de 2011

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RUY CASTRO

Problema e solução

RIO DE JANEIRO - Um fator importante no sucesso de qualquer tratamento nas clínicas de dependência química, até alguns anos, era o isolamento do paciente. Não apenas ele só tinha direito a visitas nos fins de semana como seu acesso ao telefone era regulado -havia um único aparelho comum, e cada interno só podia usá-lo dez minutos por semana. A ideia era a de que o sujeito estava ali para se tratar, não para fazer vida social, e uma clínica para esse tipo de tratamento não é um spa, resort ou salão de cabeleireiro.
Supunha-se que, para suportar a dureza da súbita abstinência e, aos poucos, adquirir alguma lucidez para absorver as palestras e terapias, o paciente não devia ficar exposto a solicitações externas -como saber que o filho tirou zero em matemática, o cunhado sofreu sequestro-relâmpago ou a namorada fugiu com o entregador de pizza. Por mais graves, esses problemas só podiam ser enfrentados depois que o paciente aprendesse a lidar com o seu inimigo maior, o álcool, a droga ou ambos.
Mas isso, naturalmente, foi antes de celular, internet, Twitter, Orkut, Facebook e outras "ferramentas" que tornaram impossível qualquer privacidade. Como fazer com que o fulano se concentre no tratamento se o mundo não o deixa em paz, nem ele o mundo?
As clínicas mais responsáveis têm aplicado ao celular a medida que já adotavam em relação a outras coisas na entrada do paciente, como dinheiro, desodorante líquido, loção pós-barba, remédios para dormir, moderadores de apetite e vários tipos de medicamento: o confisco. Não se pode correr o risco de o camarada, na agonia da abstinência, beber Aqua Velva ou cheirar Melhoral.
Da mesma forma, antes de quebrar a corrente que o prende a certas substâncias, o indivíduo precisa esquecer temporariamente que o mundo existe. Por incrível que pareça, isso é possível.


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