São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2010 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Perto no comércio, distante na informação
MARIO LUBETKIN
Enquanto um conjunto de dados econômicos demonstra as relações positivas entre Europa e América Latina, que reforçam a proximidade cultural historicamente existente, os meios de comunicação europeus há tempos veem a informação latino-americana como uma de suas últimas prioridades. Isso contribui para gerar no Velho Continente um novo estado de opinião que distancia a América Latina dos interesses europeus. Na Cúpula Euro-Latino-Americana, realizada em Madri em maio, foram fechados acordos de livre-comércio com a América Central e alguns países andinos e relançadas as negociações com o Mercosul. As informações sobre os acordos e sobre a própria cúpula ganharam espaço secundário na maioria dos meios de comunicação europeus, ou passaram despercebidas. A União Europeia (UE) é hoje a principal parceira comercial do Mercosul. A UE exporta mais para a América Latina do que para a China, e seus investimentos na região superam os que ela tem nos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China). O comércio inter-regional dobrou entre os anos de 1999 e 2008. Em contrapartida, se observamos os graus de importância atribuídos pela imprensa europeia às diferentes regiões do mundo, o primeiro é ocupado pelo próprio continente; o segundo, pelos Estados Unidos; o terceiro, pela Ásia; o quarto, pela África; apenas depois disso vem a América Latina. Essa foi a conclusão unânime dos jornalistas especializados em América Latina dos principais veículos de imprensa europeus, reunidos em seminário de diretores de ambas as regiões organizado pelo governo da Espanha e pela agência Inter Press Service (IPS), no contexto da presidência espanhola da União Europeia. De acordo com alguns analistas latino-americanos, essa região deixou de ser "notícia" para a Europa por não haver mais golpes de Estado, ondas de exilados e violações maciças dos direitos humanos. Outros consideram o fato resultante da falta de visão de jornalistas europeus, que não notam a tendência de crescimento e integração regional, que reforça o papel da América Latina no plano internacional. Poucos meios de comunicação europeus têm destacado que a recessão que afeta profundamente os Estados Unidos, a Europa e o Japão pela primeira vez não afetou em grande medida os países do Sul. Foi assinalado que as crises que afetaram os países latino-americanos -assim como os asiáticos- em períodos anteriores os levaram a adotar um rigor maior, rigor este que se traduziu em situação financeira sólida que, somada à maturidade política, trouxe estabilidade e reforçou o sistema democrático. Olhando com atenção para a relação entre as agendas da Europa e da América Latina, percebem-se aspectos de coerência e incoerência. Enquanto elas convergem nos planos da inclusão social, das liberalizações, dos direitos humanos, da repressão ao narcotráfico e do terrorismo, o protecionismo -especialmente o agrícola-, os temas relativos à migração e os rescaldos do colonialismo -como o conflito entre Argentina e Reino Unido em torno das ilhas Malvinas- separam as duas regiões. A complexidade desses fenômenos exige níveis maiores de preparo dos comunicadores. Alguns dirigentes europeus pensam que seus países estão "desatentos" em relação à América Latina. Mas um informe recente da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) observa que as relações bilaterais exigem mais atenção, já que, apesar de as duas regiões estarem ligadas pelo passado, o comportamento dos mercados vai determinar os novos tipos de alianças. De fato, a projeção das tendências comerciais atuais indica que, em 2020, a principal parceira comercial da América Latina será a China, não mais a Europa. MARIO LUBETKIN é diretor-geral da agência de notícias Inter Press Service (IPS). Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: Emílio Odebrecht: Pelo interesse de todos Próximo Texto: Roberto Muylaert: Em 2014, o Brasil tem de vencer Índice |
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