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BORIS FAUSTO
Ódio sem limites
A declaração do vice-primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, afirmando ser o assassinato de
Iasser Arafat uma opção válida para
conter o terrorismo não chega a surpreender inteiramente. Nem, muito
menos, a posterior afirmativa do
chanceler Silvan Shalom de que essa
não é a posição oficial do governo israelense. A técnica das afirmações estrepitosas, seguidas de retificação
quando as repercussões se revelam
muito negativas, é por demais conhecida para que a levemos a sério.
Por que a declaração não chega a
surpreender de todo? Porque o assassinato político é uma prática recorrente no curso da história, inclusive da
história contemporânea. Vejamos alguns exemplos de ações criminosas
tentadas ou logradas. Fidel Castro foi
alvo de uma série de conspirações fracassadas por parte da CIA, algumas de
estilo "hollywoodiano", como as que
se propunham enviar-lhe charutos
envenenados.
Pior sorte tiveram Patrice Lumumba, John F. Kennedy e Yitzhak Rabin.
Lumumba, primeiro-ministro do ex-Congo Belga, parceiro da União Soviética, foi torturado e morto em uma
operação envolvendo os belgas, os inimigos internos e as grandes corporações. Kennedy perdeu a vida em um
atentado que nunca foi esclarecido de
todo, parecendo ter resultado de uma
conspiração conjunta de extrema direita americana, exilados cubanos e
grupos mafiosos. Rabin, figura central
no caminho da paz, hoje tão distante
no Oriente Médio, foi morto por um
jovem fanático, intoxicado pela doutrinação de grupos religiosos judaicos,
que vinham pregando publicamente o
assassinato do então primeiro-ministro israelense.
O que há de surpreendente no episódio é o fato de que a hipótese de liquidação física de Arafat tenha sido proclamada por um importante membro
do governo de Israel, sem meias palavras. Sintomáticas são as indicações
de que, se as declarações de Olmert foram repelidas em quase todo o mundo, tiveram repercussão favorável em
parte da imprensa e da população israelense. Mesmo antes das declarações, um editorial do jornal "Jerusalem Post" propusera a morte de Arafat, com argumentos como "o mundo
não vai nos ajudar; temos de ajudar a
nós mesmos".
O pior de tudo é que a demonstração
de ódio sem limites não é marca registrada de certos meios judaicos, mas
uma via de mão dupla. Basta lembrar
a forma como palestinos saudaram a
morte de milhares de pessoas no episódio terrorista do 11 de Setembro.
Quando a violência contra eles chegou
às proporções a que chegou -ocupação de terras, destruição de casas, confinamento, mortes de civis inocentes- ou quando a população israelense é atingida por atentados que matam civis igualmente inocentes, não se
poderia esperar outra coisa senão o
paroxismo do ódio recíproco.
Com o fracasso da tentativa de paz
ensaiada por Bush, a inexistência de
uma alternativa ao governo Sharon e a
retomada do terrorismo, chegamos a
uma situação-limite, em que a desesperança, nos meios sensatos, se instalou. A paz ficou distante e mais distante ainda o caminho da construção de
um Estado palestino.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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