São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Amnesi-hausen

IDELI SALVATTI

O presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen, autor de sucessivos textos, tem dedicado sua produção "literária" a criar neologismos como "PTaxas" ou "PT, Partido dos Tributos" e também a criar teses responsabilizando o PT e o governo Lula por situações que não resistem a um mínimo de análise e verificação factual. Parece que quer fazer política à custa da supressão da história e de suas responsabilidades enquanto governante.
O presidente do PFL, juntamente com lideranças do PSDB, repete à exaustão a tese de que o aumento da carga tributária é responsabilidade do governo atual. Insistem em dizer que o governo Lula trata dos tributos unicamente como forma de fazer caixa e que, por isso, gera desemprego, inviabiliza a produção e freia o desenvolvimento. Chega a declarar, num dos últimos artigos: "Li, estarrecido, que os brasileiros pagam R$ 19,8 mil de impostos por segundo".


Convém lembrar o que o senador Bornhausen omite: no governo FHC, a carga tributária subiu de 26% para 36% do PIB


Eu e todos os que têm um pouco de memória é que ficamos estarrecidos com declarações tão anacrônicas, para não adjetivá-las de forma mais contundente. A amnésia impera. Só isso pode justificar retirar da história recente do país as iniciativas e responsabilidades pelo maior aumento da carga tributária ocorrida ao longo de um governo.
Convém lembrar o que o senador Bornhausen omite: nos oitos anos do governo FHC, do qual ele fez parte, a carga tributária total do país subiu de 26% para 36% do PIB, em média mais de 1,2 ponto percentual ao ano. Esse aumento significativo envolveu a elevação de vários tributos, especialmente a CPMF, a Cofins e o Imposto de Renda. Tomados em conjunto, os tributos das três esferas de governo subiram quase 80% entre 1994 a 2002. Tratou-se de aumento brutal, e, ao longo desse período, não ouvi nem um único gemido de estarrecimento ou de incentivo a iniciativas como o Feirão dos Impostos, atualmente elogiadas.
É oportuno destacar também que a ênfase dada à ampliação da arrecadação relativa às contribuições aumentou a fatia destinada à esfera federal, em detrimento dos repasses para os Estados e municípios. Para exemplificar, a Cide, que foi criada no governo anterior, só passou a destinar parte da arrecadação aos Estados e municípios por iniciativa do governo Lula, inicialmente de 25% e, agora, de 29%.
Em agosto último o governo Lula lançou um pacote de medidas para reduzir a carga tributária, tendo como objetivo desonerar o setor produtivo, estimular o investimento e a poupança de longo prazo, desenvolver o mercado de capitais e facilitar as exportações. Entre as ações promovidas destaca-se a redução do PIS e da Cofins para os produtos da cesta básica, com a reação imediata nos preços dos supermercados.
Parte da insistência na tese de aumento da carga tributária praticada pelo atual governo está baseada na divulgação de dados pelo IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário). Aliás, o senador Bornhausen utiliza os dados do IBPT como definitivos e incontestáveis nos seus artigos. Um simples acesso ao site do IBPT pode comprovar que, ao longo de 2003, as previsões alarmantes de aumento da carga tributária foram refeitas várias vezes. Essas alterações promovidas pelo IBPT já foram tema de artigo da jornalista Sonia Racy e as previsões alarmantes vêm sendo contestadas pelos técnicos da Receita Federal e do Ministério da Fazenda, por se basearem em cálculos que não preservam a sazonalidade dos impostos e taxas.
Insistem em fazer o cálculo da carga tributária em face do PIB sem utilizar o dado anual que só é consolidado e oficialmente aceito nos primeiros meses do ano seguinte. Só para exemplificar, o IBPT previu inicialmente que a carga tributária para 2003 seria de 38,52% do PIB, previsão esta transformada em dado definitivo de apenas 36,11%. Tratou-se de aumento marginal de 0,27 ponto percentual, segundo os próprios números do instituto. Pelos dados oficiais do governo, o aumento foi de 0,16%, sendo que 0,12% foi referente ao aumento da carga municipal.
É bom lembrar ainda que a média anual de crescimento do PIB nos oitos anos de gestão do governo anterior foi de 2,3%. Neste primeiro semestre de 2004, já atingimos 4,2% e as previsões para o ano são de 4,5% de crescimento -a maior taxa verificada nos últimos dez anos.
Se enveredarmos por outros indicadores, como na questão do emprego, à qual o senador Bornhausen insistentemente também se reporta, é bom lembrar que, de janeiro a setembro deste ano, foram criados quase 1,7 milhão de empregos com carteira assinada, números que não se concretizavam havia mais de 12 anos.
O desafio que nos foi deixado no final de 2002, com a grave crise econômica, está sendo superado com a retomada da estabilidade e do crescimento econômico. Para que se dê sustentabilidade ao desenvolvimento econômico e social, o governo deve manter a responsabilidade na condução das políticas fiscal e monetária. Assim, será possível reduzir o endividamento público e controlar a inflação, abrindo espaço para a redução da carga tributária e para a ampliação dos investimentos em programas de inclusão social.
Respeitamos a oposição, mas sem abolir a história e a memória.

Ideli Salvatti, 52, professora licenciada em física pela Universidade Federal do Paraná, senadora pelo PT-SC, é líder do partido e do bloco de apoio ao governo no Senado.


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