São Paulo, sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

2007, porta aberta para o diálogo

JOSÉ ROBERTO MARINHO


O debate recente sobre o licenciamento ambiental não deve se restringir a burocracias. Deve suportar escolhas essenciais ao país


O TEMA ambiental vem ganhando espaço em todas as agendas. Nos governos, foi traduzido em institucionalização e normas; na área produtiva, envolve sistemas de gestão; e, na sociedade, se expressou por meio das entidades ambientalistas. A despeito da enorme energia despendida para a gestão ambiental, o assunto ainda não ganhou centralidade no âmbito das políticas públicas, no qual tem se caracterizado mais como um setor com burocracia própria do que como um conjunto de valores e diretrizes que necessitam perpassar todas as iniciativas do país.
Essa falta de centralidade talvez seja revertida com o ganho de força política provocado pela mudança climática global. É presumível que o aquecimento global, cada vez mais evidente, acelere o entendimento dos vários agentes ambientais. O desmatamento, que sofreu redução sensível nos últimos anos, necessita continuar sua curva de declínio. O espaço de terras já convertidas é suficiente para ampliar muitas vezes nossa produção agrícola capitalizada. Nesse sentido, a iniciativa de disciplinar o acesso às florestas públicas deve ser apoiada, mas o arranjo econômico deverá ser viável, competindo com um contexto em que a informalidade é parte das vantagens da cadeia exploratória dominante. Controle do território, bons contratos, transparência e consumo consciente serão essenciais para reverter a devastação e trazer vantagens sociais com a manutenção das florestas.
Somadas as florestas públicas e as terras indígenas, o Brasil tem um aumento substancial das áreas protegidas nos últimos dez anos. Os compromissos de dispormos de uma rede representativa de unidades de conservação vêm sendo cumpridos e aumentam as possibilidades de não repetirmos os erros do passado.
Porém esse esforço ainda carece de mecanismos para a consolidação das áreas existentes. São muitas as possibilidades, mas a experiência internacional indica que o caminho das concessões, principalmente nos parques nacionais, pode contribuir para a economia regional, gerar receita e ainda ampliar o conhecimento sobre nossa diversidade biológica e de paisagens.
Além da valorização da floresta em pé e do fortalecimento da conservação de áreas naturais, temos que reverter a falta de infra-estrutura para o desenvolvimento e fazer com que os investimentos essenciais se harmonizem com as exigências socioambientais. Infelizmente, por exemplo, os últimos leilões de energia aumentaram a dependência de combustíveis fósseis para atender nossa demanda de energia elétrica, sinalizando na contramão das nossas possibilidades renováveis.
Por outro lado, temos a experiência paradigmática da BR 163, estrada que liga Cuiabá (MT) a Santarém (PA), em que o diálogo entre governo, sociedade (WWF, entre outros) e setor privado estabeleceu agenda de gestão do território, com o aumento da presença do poder público e a inclusão dos interesses regionais.
Entre nossas necessidades de infra-estrutura, a matriz energética, essencial para nosso desenvolvimento, necessita ganhar relevo e fazer parte da preocupação geral da sociedade. Tema que exige planejamento de longo prazo e determina nossa competitividade, requer atenção e clareza sobre opções. Temos alternativas e devemos explorá-las com foco na segurança, nas nossas vantagens competitivas e nos impactos. Por isso, o amplo debate recente sobre o licenciamento ambiental não deve se restringir a burocracias e prazos, mas deve suportar escolhas essenciais para o país.
É preciso dar mais agilidade e transparência ao processo, evitando o ir e vir da burocracia e, no seu lugar, montar um sistema em que cada empreendimento tenha um ritual proporcional ao seu tamanho e relevância, mas que os pretendentes ao licenciamento saibam de antemão como montar e encaminhar seus projetos.
Com isso, evita-se que o processo seja uma seqüência sem fim de "julgamentos", aumentando sua previsibilidade e segurança jurídica. Um exemplo desse novo procedimento é o que o Estado de Minas Gerais vem adotando e que deverá ser também implantado na futura gestão ambiental do Rio de Janeiro. Como declarado recentemente, os pequenos empreendimentos seriam licenciados na alçada municipal, e os outros, no âmbito estadual ou federal, dependendo do alcance dos impactos.
Isso clareia, de forma simples, quem são os interlocutores dos empreendedores e quais serão as regras. O desafio da gestão ambiental, tanto interna como externamente, requererá como nunca mediação e gestão. Minha esperança é que 2007 seja o ano do diálogo de qualidade.
JOSÉ ROBERTO MARINHO, jornalista, é vice-presidente de Responsabilidade Social das Organizações Globo e presidente da Fundação Roberto Marinho.


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