São Paulo, sábado, 23 de janeiro de 1999

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O incêndio em Mariana

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

O fogo apenas começou e já se alastrava violentamente pelo forro e telhado da bela e veneranda igreja de Nossa Senhora do Carmo, em Mariana. O incêndio foi rápido e incontrolável. Estavam os operários levando adiante, com alto rigor técnico, o árduo trabalho de descupinização. As antigas igrejas, principalmente em Mariana, estão sendo atacadas pelo cupim. Com apoio cultural e econômico do BNDES foi possível, após a licitação entre as empresas, proceder, no final de 98 e neste ano, à preservação de várias igrejas.
Que terá acontecido na tarde de quarta-feira, dia 20? Foi um acidente. Aguardamos o laudo dos técnicos. A suspeita é que a explosão de uma lâmpada acarretou um curto-circuito. A faísca passou para as substâncias inflamáveis utilizadas na eliminação dos cupins. Seguiu-se o incêndio que destruiu o teto e o interior do templo.
A igreja do Carmo, terminada no fim do século 18, compõe, com a igreja de São Francisco de Assis e o antigo presídio, hoje Câmara dos Vereadores, a mais bela vista de Mariana. Nos últimos dez anos era precária a situação do telhado e, quando um florão de largas proporções caiu do alto sobre o altar, foi preciso interditar a igreja, à espera de recursos adequados para a futura reforma.
Nos anos de 94-97, sob a presidência do dr. Francisco José Schettino, a Companhia Vale do Rio Doce, conforme o próprio estatuto, destinou verba anual a projetos culturais e sociais nas cidades onde são extraídos minérios.
Entre os projetos aprovados em 95 estava a restauração da igreja do Carmo, em Mariana. Os trabalhos, sob a competente orientação do Iphan, começaram pelo telhado e pela estrutura de sustentação. Nos anos seguintes, novos projetos incluíam reforma do forro, sistema elétrico e pintura. Mesmo sem os últimos acabamentos nos altares e na sacristia, para grande alegria do povo, as portas foram abertas e a igreja devolvida ao culto. A generosidade da Irmandade de Nossa Senhora do Carmo contribuiu com alfaias e paramentos.
Desde então, as celebrações litúrgicas realizavam-se com regularidade e muita participação dos fiéis.
A orientação da Vale do Rio Doce, após a privatização, modificou a decisão de financiar obras em apoio às comunidades. No entanto, em 98, o BNDES, ao lançar amplo programa de restauração e conservação de monumentos históricos, não só acolheu o projeto de complementação dos trabalhos na igreja do Carmo como a incluiu entre os prédios que receberiam urgente descupinização. Tudo procedia bem e, com a fiscalização do Iphan e o maior cuidado dos técnicos e operários, faltava pouco para concluir a reforma. Ninguém podia prever que as chamas do dia 20 consumiriam tão rápido o templo restaurado em quatro anos. Ao primeiro alarde do fogo, os sinos das igrejas convocaram o povo, que acudiu de todos os lados. Vendo as labaredas, muitas chamas, muitos choravam.
A cidade de Mariana não dispõe de serviços de bombeiros capazes de sustar um incêndio tão violento, e socorros distantes tardariam a chegar. Em poucos minutos o teto desabou.
Graças a Deus não houve vítimas. O altar-mor com as hóstias consagradas foi preservado. A diligência dos vizinhos conseguiu salvar várias imagens. Resta agora reunir forças. O ministro da Cultura já ofereceu seu apoio. Estou certo de que não faltará cooperação do povo e dos órgãos governamentais, a fim de reconstruir, quanto antes e com amor, o santuário de Nossa Senhora do Carmo, padroeira querida da cidade de Mariana.


Dom Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.



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