São Paulo, segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

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Outro PMDB

RITA CAMATA


Já não sabem os que estão longe da instância decisória o que o PMDB defende além de interesses particulares e projetos pessoais de poder

MINHA VIDA pública confunde-se com a história do PMDB. Já são mais de 25 anos, nos quais nunca deixei de manifestar a minha opinião. Agora não seria diferente. As declarações do senador Jarbas Vasconcelos abrem uma ferida e nos levam a pensar no caminho que o partido já trilhou e naquele que optou por seguir. Foi um desabafo. Inconformismo que, tenho certeza, não é de apenas um parlamentar. Fazemos isso sempre em reuniões internas ou em conversas informais com colegas de partido.
Os que estão longe das instâncias decisórias já não sabem o que o PMDB defende além de interesses particulares e projetos pessoais de poder. Nesse ambiente é difícil não perder de horizonte aquele outro partido, o MDB de anos atrás, quando se apresentava com um projeto para o país e nos permitia alimentar ideais e lutar por eles. Esse já não existe.
Desapareceu juntamente com o espaço democrático que tínhamos para debater questões fundamentais para o Brasil e a luta por conquistas coletivas para a sociedade. Hoje, tais objetivos são perseguidos apenas pelo esforço pessoal e isolado daqueles que, felizmente, não abrem mão de exercer a política de outra forma.
Reconheço que tenho tentado, em vão, enfrentar a lógica prevalecente e, nesse sentido, considero as colocações do senador Jarbas Vasconcelos um ato de coragem. Expôs seu descontentamento com o grupo que controla o partido e que, por isso mesmo, se dá o direito de marginalizar os que não comungam de seus métodos e ações. E mais, não permitem aprofundar o debate no fórum adequado -dentro do partido-, encarando qualquer crítica como ataque pessoal, porque pessoal é o projeto.
Mas sejamos honestos: o que são essas aglomerações às quais chamamos partidos, senão o fruto de um sistema político eleitoral já desgastado e moribundo? Soma-se a esse fato o descrédito da população para com o Congresso Nacional, perpetuando a tese de que todos os políticos são iguais e legitimando as práticas vigentes. Banaliza-se a discussão e consolida-se a máxima de que "em time que está ganhando não se mexe". A pergunta é: quem ganha? o que ganha? Não me parece que seja a democracia interna do partido.
Quanto antes nos dermos conta dessa anomalia, mais apoio ganharemos para promover alterações necessárias, por exemplo, em nossa legislação político-eleitoral. Por que há tanta resistência ao financiamento público de campanhas? Porque a nova regra acarretaria, necessariamente, mudança de velhas práticas e nem sempre isso é desejável. Por que a insistência na adoção do sistema de lista fechada, quando sabemos ser mais um instrumento a serviço dos interesses de cúpulas?
Estou convicta de que não conseguiremos avançar na discussão dessas questões sem uma grande mobilização. Precisamos agregar forças e contar com o apoio da sociedade e da imprensa brasileira. Caso contrário, continuaremos a assistir, impotentes, denúncias das mais variadas.
O escândalo da semana passada será facilmente esquecido quando surgir um novo. Viveremos de escândalo em escândalo, sempre acreditando que amanhã poderá ser diferente, que haverá uma conscientização maior, que maus políticos não mais serão eleitos, uma vez que os eleitores saberão extirpar esse câncer do nosso sistema representativo.
Embora saibamos dessas dificuldades, alguns de nós mantêm a disposição de continuar a lutar por um partido forte, com bandeiras de combate às desigualdades sociais, e pelo fortalecimento da democracia. Às vezes, somos tomados pelo desânimo, mas perseveramos. Sem permitir que a poderosa estrutura nos engula.
Afirmo isso com a tranquilidade de quem conhece como funcionam as engrenagens de um grande partido.
Existe hoje um abismo entre o PMDB que ajudei a construir e esse que é questionado por um colega parlamentar. É uma lacuna a ser preenchida com atitudes de quem ainda acredita que outro PMDB é possível.
De qualquer forma, para quem não acredita mais ser viável trabalhar mudanças de rumos dentro das nossas próprias instâncias, resta-nos sempre a opção de continuar na trilha da ética, do respeito ao povo e aos seus anseios e do exercício da política com transparência.


RITA DE CÁSSIA PASTE CAMATA, 46, jornalista, membro da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, é deputada federal pelo PMDB-ES. Foi secretária de Desenvolvimento Urbano, Infraestrutura e Transportes do Espírito Santo (2003-2006).


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