São Paulo, sexta-feira, 23 de abril de 2004

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BLAIR NA BERLINDA

Numa decisão que surpreendeu aliados e adversários, o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, anunciou que levará a futura Constituição européia a plebiscito no Reino Unido. A medida, que a imprensa dos dois lados do canal da Mancha já classificou como a "mais espetacular reviravolta de Blair" e "arriscada aposta política", é temerária. O premiê tem muito a perder com uma derrota da proposta de Constituição nas urnas britânicas e pouco a ganhar na hipótese inversa.
Blair e a esmagadora maioria do Partido Trabalhista, que são ardorosos defensores da participação do Reino Unido na União Européia, sempre se opuseram a levar questões européias a referendo. Sabem que a população britânica é possivelmente a mais refratária à idéia da confederação. Pesquisa divulgada nesta semana mostrou que 53% dos britânicos são contrários à Constituição européia e só 16% são favoráveis. E uma eventual rejeição da Carta pelo Reino Unido, pelo menos em teoria, impediria sua adoção pelos demais 24 países da União Européia. É que, para vigorar, a Constituição precisa ser ratificada por todos os membros.
O premiê britânico vem recebendo, portanto, pesadas críticas por ter "europeizado" uma questão doméstica. Especula-se que tenha optado pelo plebiscito, entre outras razões, por pressão do magnata da mídia Rupert Murdoch, ferrenho adversário do Reino Unido na União Européia. Vários órgãos da imprensa afirmam que Murdoch teria ameaçado não apoiar Blair em sua tentativa de reeleger-se a menos que fosse anunciado o referendo.
Outras razões citadas para a reviravolta do premiê são a tentativa de afastar o Iraque do centro do debate e o receio de que a própria eleição, que deverá ocorrer em maio de 2005, acabasse se tornando um plebiscito em torno da Constituição européia.
Pelas primeiras reações, contudo, a manobra não teve os efeitos desejados, pois, até aqui, Blair só conseguiu despertar a ira dos aliados e a galhofa dos adversários.


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