São Paulo, sexta-feira, 23 de junho de 2006

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O drama da Varig

Insistência num modelo que maximiza a folha de pagamentos dificultou uma saída promissora para a empresa aérea

É NOTÁVEL o esforço dos funcionários da Varig para tentar salvar a empresa. Infelizmente, a atitude heróica, de pessoas que não lutam apenas pela manutenção de seus empregos mas pela sobrevivência de uma marca que há décadas tem sido símbolo da aviação civil brasileira, não vem conseguindo frear o ritmo também notável em que se deterioram as perspectivas do negócio.
Ainda que deposite hoje os US$ 75 milhões que endossariam a compra da parte supostamente saudável da empresa, o consórcio TGV (Trabalhadores do Grupo Varig) -ou qualquer outro comprador (surge agora uma proposta informal da VarigLog)- será o gestor de uma companhia que parece menor a cada dia. Ficaria em suspenso a capacidade de geração de receita da nova Varig, diante do número reduzido de aeronaves e de rotas nas quais será capaz de operar.
Também impressiona a ausência de menção a que tipo de reestruturação o TGV pretende fazer no quadro funcional para adaptar a empresa a seu novo tamanho -e para torná-la rentável. Estimativas do mercado dão conta de que, no caso de a companhia deixar de operar, a aviação civil brasileira teria capacidade de absorver pouco mais da metade dos 11 mil trabalhadores da Varig. A absorção significaria, também, uma sensível redução na média salarial dos oriundos da companhia rio-grandense.
A insistência em um modelo de negócios que maximiza a folha de pagamentos e a resistência da fundação que geria a Varig em abrir mão de poder foram dois dos principais entraves a uma reestruturação promissora no passado, quando havia perspectivas de, isolando a "parte podre", configurar-se uma empresa grande e competitiva. Exposta a uma concorrência com estrutura bem mais enxuta de custos, todas as saídas para a Varig passavam por demissões e redução dos gastos com funcionários.
Planos apresentados por diversos ministros e governos foram rejeitados pela empresa. Talvez seus dirigentes nutrissem esperança quase mística de que, ao fim e ao cabo, nenhum governo, quanto menos um gerido pelo PT, deixaria uma companhia com a história da Varig quebrar.
Teria feito sentido, há três, cinco ou dez anos, o governo, através do BNDES ou de outro mecanismo, injetar dinheiro em uma companhia aérea reestruturada, que tivesse horizontes para crescer. O erário é o maior credor da empresa e teria interesse em recobrar ao menos parte das perdas em que incorrerá caso a companhia deixe de operar. Salvar a Varig, nesse contexto, seria uma moeda política que interessaria a qualquer homem público.
A falta de visão, principalmente da parte dos gestores da companhia aérea, levou ao impasse atual. Propiciou o ajuste particularmente selvagem a que se assiste agora, porque muito mais doloroso para a empresa, seus funcionários, seus clientes e seus credores -e para a marca Varig- do que se o bom senso de perder um pouco no presente para ganhar perspectiva de vôo no futuro tivesse prevalecido em algum lugar do passado.


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