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São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Os filhos do Brasil

ODED GRAJEW

A taxa de desemprego atinge brutalmente a população jovem. Os jovens compõem hoje cerca de 50% do total de desempregados. São quase 7,6 milhões de pessoas que têm de 16 a 24 anos e que estão desocupados, inativas e fora da escola. Seja pela inexperiência, seja pela baixa inserção educacional, os jovens são as maiores vítimas do desemprego, que pune ainda mais os afrodescendentes e as mulheres.
Em relação direta com essa realidade, o Ministério da Justiça informa que cerca de dois terços de toda a população carcerária brasileira é composta por jovens. Qualquer um que tenha um mínimo de bom senso e racionalidade sabe que ou mudamos radicalmente esse caminho, ou não haverá futuro melhor para o nosso país. Os jovens de baixa renda, que são a grande maioria, querem e precisam de uma oportunidade. Ao não encontrar apoio nos governos, na sociedade civil e nas empresas, serão empurrados para o desespero e a marginalidade.
Órgãos das Nações Unidas, especialmente a OIT (Organização Internacional do Trabalho), têm elaborado recomendações para ajudar a combater o desemprego entre os jovens, destacando a necessidade de especificidade para políticas de emprego que envolvam iniciativas criativas e mobilizadoras de toda a sociedade. Particularmente na promoção de políticas que caminhem no sentido de garantir uma maior qualificação (aumento de capital humano), mas também a transferência imediata de renda (renda mínima, bolsa-trabalho, bolsa de estágio), incorporando o emprego juvenil nas estratégias de desenvolvimento e redução da pobreza.
As recomendações e os estudos ainda sugerem que essas políticas têm um efeito imediato sobre a redução da violência, uma vez que interromperiam o ingresso de jovens em atividades ligadas ao crime organizado e à marginalidade -o que reforçaria a necessidade dessas ações por parte do poder público em articulação com a sociedade civil.
Os países que criaram políticas públicas de emprego para jovens conseguiram reduzir consideravelmente as taxas de desemprego. As experiências européias entre 1996 e 2001 demonstraram bons resultados na Espanha, Holanda e Irlanda. Entre elas há uma coerência no sentido de mobilizar os recursos públicos e privados. E não pode ser diferente. Entendendo que a responsabilidade de priorizar a geração de emprego para os jovens é dos governos.


Os jovens de baixa renda, que são a grande maioria, querem e precisam de uma oportunidade

O governo Lula propõe um conjunto de iniciativas que, pela primeira vez em nosso país, universalizam o primeiro emprego. Estão contempladas as mais diferentes modalidades de inserção do jovem, seja por meio da qualificação profissional na aprendizagem ( jovens de 16 a 18 anos) e estágio (16 a 24 anos); seja através do protagonismo e empreendedorismo com a participação em trabalhos comunitários e serviço civil voluntário; seja por meio do primeiro emprego formal .
O Programa Primeiro Emprego está voltado a todo tipo de empregador, público ou privado, pequeno ou grande, urbano ou rural. Aposta na consciência crescente do empresariado para a responsabilidade social, mas também cria mecanismos de incentivo à criação de novos postos de trabalho. Busca formalizar novos empregos na atividade produtiva e incentiva o trabalho comunitário e o empreendedorismo. Busca aperfeiçoar a legislação e cria mecanismos de debate e participação de toda a sociedade na construção dessas políticas.
Neste momento, em que o governo federal apresenta à sociedade o Programa Primeiro Emprego, os empresários brasileiros têm a oportunidade de se engajarem definitivamente na mudança de paradigma com relação ao emprego jovem. Repensar a lógica tradicional do mercado, que elimina postos de trabalho, precariza e substitui mão-de-obra e desemprega. Quantos jovens e por quanto tempo a sua empresa, o seu negócio podem contratar, podem adotar para trabalhar na produção ou em programas sociais, sem risco econômico ou financeiro? O que dá para fazer já?
Atendendo ao chamado do presidente Lula, dezenas de empresas públicas, privadas e entidades empresariais estão se engajando. Criando novos postos de trabalho em suas diferentes sedes, apoiando empregos para jovens em atividades comunitárias e em ONGs, educando e empregando aprendizes e cumprindo exemplarmente a lei 10.097, convocando fornecedores e clientes a se engajarem, criando mecanismos de incentivo entre as próprias empresas, mobilizando e sensibilizando seus associados.
Sabemos, cada vez mais, que não poderemos construir ilhas de prosperidade cercadas de pobreza. O resultado será uma sociedade cada vez mais esgarçada e violenta. O futuro do país depende de nossas ações no presente. A nossa qualidade de vida e a dos nossos filhos será decidida pelas prioridades que estabelecermos no presente. Precisamos agir rapidamente para que nossos filhos não nos apontem o dedo, dizendo: "Por que vocês não deixaram um país melhor para nós? Por que vocês não agiram enquanto havia tempo? Por que vocês não perceberam que cuidar das crianças e dos jovens brasileiros deve ser a maior prioridade de qualquer povo?".
Vários leitores deste artigo sabem que chegaram aonde chegaram porque seus pais fizeram muitos sacrifícios a fim de que tivessem saúde e boa educação para assegurar seu futuro. Inquestionavelmente, eram a prioridade absoluta nas atenções e no orçamento familiares. Precisamos olhar os jovens brasileiros como se fossem nossos filhos, filhos do nosso Brasil.

Oded Grajew, 59, idealizador do Fórum Social Mundial e presidente licenciado do Instituto Ethos, é assessor especial do presidente da República.


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