|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SÉRGIO DÁVILA
O ovo e a serpente
"Em geral, o que ele busca é
meio mãe, meio namorada. (...)
Também obtém satisfação estética de
garotos e garotas. (...) Outra de suas citações preferidas era um provérbio
russo: "Se você vai a uma mulher, não
esqueça o chicote"."
O texto continua. "Teatro -ele raramente ia ao teatro. Circo -ele ama
o circo. A emoção de atores malpagos
arriscando suas vidas é um prazer real
para ele. (...) Não liga muito para números com animais, a não ser que tenha uma mulher correndo perigo."
Mais: "Notícias -ele tem uma paixão avassaladora por saber as últimas
notícias. Se alguém entra na sala com
os jornais mais recentes, é capaz de interromper a reunião mais importante
para dar uma folheada nas páginas.
(...) Quando vai para a cama, sempre
leva vários periódicos ilustrados, incluindo revistas norte-americanas e
várias publicações militares e navais".
Estamos falando dos hábitos do ditador nazista Adolf Hitler (1889-1945).
Seu dia-a-dia, assim como análises e
conclusões que hoje em dia soam ingênuas, corroboradas por um certo
dr. Sedgwick, está dissecado em relatórios feitos por vários espiões americanos durante os anos 30 e 40.
Os escritos têm grande valor histórico e humano e estão à disposição no
site The Smoking Gun (A Pistola Fumegante; www.thesmokinggun.com),
um dos mais iconoclastas e investigativos entre os milhões disponíveis na
internet.
O documento foi levado a público há
poucas semanas pela CIA, a agência
de inteligência dos EUA. Faz parte do
War Crimes Disclosure Act, lei de
1998 segundo a qual o governo tem a
obrigação de tornar acessíveis registros sobre a Segunda Guerra. Os textos, então secretos, eram preparados
pelo Escritório de Serviços Estratégicos, órgão que depois viraria a CIA.
O relatório tem 68 páginas originalmente, o site colocou no ar as 11 mais
saborosas, justamente as que tratam
do lazer e da vida sexual do führer. Data de 3/12/1942, décimo ano de Hitler
no poder, auge da Segunda Guerra e a
três anos de sua derrocada.
O texto não fala, mas sabe-se que a
única relação regular entre o nazista e
uma mulher foi com a alemã Eva
Braun, que teria conhecido em 1930,
quando ela ainda era uma vendedora
adolescente. Ambos viveram juntos
de 1936 até 30/4/1945, quando se teriam suicidado no bunker em Berlim.
Acredita-se ainda que se tenham casado no dia anterior às mortes.
Hitler proibia Eva Braun de aparecer
em público consigo e mesmo de ir a
Berlim. Ambos só mantinham encontros íntimos no retiro do nazista em
Berchtesgarden, na Baviera. É ali,
aliás, que se passa um dos filmes mais
interessantes sobre o ditador. Em
"Moloch", o russo Alexander Sokurov
retrata um fim de semana imaginário
entre Hitler, Eva e os amigos Joseph
Goebbels e Martin Bormann.
Não há sexo no filme, como não há
também em "Taurus", exibido na semana passada em Cannes, em que Sokurov imagina os últimos dias de Lênin -o cineasta parece acreditar que
os grandes déspotas do século 20 eram
assexuados. Não é o que consta nos relatórios da CIA, o que os torna ainda
mais interessantes.
A conclusão do autor (anônimo),
baseado no tal dr. Sedgwick e nos relatos dos espiões, é que Adolf Hitler era
sexualmente reprimido. Se isso tem
relação com o fato de ele ser responsável pelos maiores horrores do século
20, é algo que só outro austríaco famoso poderia explicar.
Sérgio Dávila é colunista e correspondente da
Folha em Nova York. Hoje, excepcionalmente,
não é publicado o artigo de Otavio Frias Filho,
que escreve às quintas-feiras nesta coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Tempo de trevas Próximo Texto: Frases
Índice
|