São Paulo, sexta-feira, 24 de junho de 2011

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Deficit constitucional

STF ameaça regulamentar aviso prévio proporcional previsto na Constituição de 1988; medida traria prejuízo econômico e para instituições

À primeira vista, o Supremo Tribunal Federal (STF) aproximou-se demais de usurpar atribuição do Congresso Nacional com a prometida regulamentação do aviso prévio na demissão de trabalhadores.
Não compete à Corte Constitucional ocupar-se de definir se demitidos fazem jus a um mês adicional de emprego (ou a ressarcimento equivalente) a cada três anos trabalhados, ou seis, ou dez.
Parece evidente que tais detalhes estão e devem permanecer na alçada do Legislativo. Na pior hipótese, poderiam ser regulados por medida provisória, já que carradas delas são enviadas ao Congresso pelo Executivo. Ao STF se reserva o controle da constitucionalidade das leis, não a formulação positiva de seu conteúdo.
No Brasil, contudo, freios e contrapesos entre os Poderes da República andam descalibrados, e não é de hoje, nem de responsabilidade exclusiva de um deles. Todos concorrem para o tumulto legal que atravanca a vida dos particulares e o funcionamento de empresas, governos e tribunais.
É coletiva, e sinal de deficiência institucional, a omissão que permite a um dispositivo constitucional permanecer 23 anos sem regulamentação nem aplicação. Se fossem mais disseminados o hábito e a disciplina de atentar para o texto constitucional, todos saberiam que seu artigo 7º prevê "aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de 30 dias, nos termos da lei".
O Supremo, portanto, apenas reconheceu que o aviso prévio deve ser proporcional e apontou a inexistência do dispositivo regulamentador. E não o fez de moto próprio, mas provocado por funcionários demitidos da Vale.
Os trabalhadores reivindicam uma regra provisória para a proporcionalidade, enquanto durar a omissão quanto ao regulamento (a praxe de mercado é conceder só o mínimo de 30 dias). O STF deveria limitar-se, contudo, a indicar ao Congresso a obrigatoriedade de regulamentar o artigo 7º.
A decisão final ainda não veio, graças ao pedido de vista do relator, mas seria indesejável que o Supremo a tomasse especificando um critério para a proporcionalidade. Qualquer dia a mais de aviso prévio implicará encarecimento da mão de obra, o oposto do que necessita a economia nacional, já cumulada com regras que enrijecem o mercado de trabalho.
O episódio explicita, ainda, a questão mais geral dos dispositivos que aguardam regulamentação desde 1988.
O ativismo do STF, por vezes benéfico, só encontrará um limite natural quando os três Poderes se coordenarem para identificar todas as pendências e iniciarem um mutirão para reduzir esse escandaloso deficit constitucional.


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