São Paulo, sexta-feira, 24 de setembro de 2004

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NOVOS DILEMAS

São freqüentes os casos de avanços tecnológicos que produzem situações de dilema moral antes inexistentes. Uma nova safra dessas dificuldades surgiu com a disseminação de testes genéticos para a detecção de tipos comuns de câncer. O problema ético que se coloca é se os familiares do paciente devem ser informados do resultado dos exames, uma vez que a maior propensão do indivíduo a sofrer de um mal muitas vezes significa um risco aumentado de seus parentes consangüíneos de padecerem da mesma doença.
A confidencialidade da relação médico-paciente pode ser quebrada? Se a resposta é afirmativa, em quais circunstâncias? A discussão sobre esse espinhoso tema vai ganhando temperatura. A influente "Jama" ("Journal of the American Medical Association") traz em seu número desta semana um artigo sobre o assunto.
Autoridades norte-americanas federais e estaduais já cogitam de criar dispositivos legais que obriguem médicos a relatar resultados positivos a familiares mesmo que isso implique quebrar o sigilo da relação com seus pacientes. A analogia aqui é com doenças infecciosas de notificação compulsória. O direito à privacidade não pode constituir-se numa barreira à saúde de terceiros.
A posição dos autores do artigo, encabeçado por Kenneth Offit, do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, e também a desta Folha é contrária à obrigatoriedade do aviso, pois entendemos que a autonomia do paciente deve ser preservada, sobretudo num caso relativo a seu código genético. Este é o que cada um tem de mais íntimo. O médico deve tentar convencer o paciente a avisar todos os parentes que possam beneficiar-se da informação, mas não pode impor a sua visão.
Embora algumas moléstias detectáveis geneticamente, como o câncer de mama, possam ser prevenidas ou tratadas precocemente, com melhor prognóstico, existem males que não comportam nenhum tratamento ou prevenção, como a doença de Huntington. Não há muito propósito em avisar alguém de que ele tem boas chances de sofrer de uma doença incurável e incapacitante.


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