São Paulo, sexta-feira, 24 de setembro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A Batalha de Itararé

ROBERTO JEFFERSON

O Partido Trabalhista Brasileiro repudia veementemente a informação de que é beneficiário de um acordo com o PT que envolveria dinheiro e cargos. Essa informação surgiu na mídia no último fim de semana e tem de ser desmentida, pois não corresponde à verdade.
Há um acordo do PTB com o PT, é verdade, mas o acordo é político, não pecuniário. Apoiamos o governo do PT tanto no Congresso como nas eleições municipais, movidos pela idéia da convergência, já que entendemos que o país só avançará no ambiente do consenso possível. Pertencemos à base aliada, portanto, por acreditar que esse é o melhor caminho. Assim nos comportamos em outros períodos da vida política brasileira, como ocorreu na gestão Fernando Henrique Cardoso.
O PTB enfrenta divergências internas, fruto das tensões naturais dos períodos eleitorais. Nestas eleições, em que os recursos são escassos e canalizados para os candidatos potencialmente vencedores, principalmente. Em 2002, o então presidente do PTB, José Carlos Martinez -falecido há pouco menos de um ano-, assumiu o compromisso com filiados de Pernambuco de apoiar política e financeiramente a candidatura de Joaquim Francisco à Prefeitura de Recife. Sucessor de Martinez, assumi a presidência do partido com o firme propósito de honrar os acordos feitos pelo ex-presidente -acordos legítimos, diga-se. Mas não tem sido fácil. Recorri ao presidente do PT, José Genoino, pois não há nada que impeça um partido de auxiliar o outro. O PT tem um acordo político-eleitoral com o PTB, e isso é normal entre aliados, como ocorreu na campanha presidencial de Ciro Gomes, do PPS, em parte patrocinada com recursos do PTB.
O presidente do PT, no entanto, não pôde colaborar, pois optou por priorizar seus candidatos, uma vez que, como já dito anteriormente, há carência de recursos. Em nenhum momento, porém, essa conversa transpôs quaisquer outros gabinetes que não os das presidências dos dois partidos. Calejado por seis mandatos parlamentares, sou um político experiente e sei muito bem respeitar a liturgia que o cargo impõe.


O PT tem um acordo político-eleitoral com o PTB, e isso é normal entre aliados


A realidade, no entanto, é penosa para o PTB de Pernambuco. São essas as razões que justificam o clima tenso em Recife. E que talvez expliquem por que alguns parlamentares do partido chegaram a pedir o rompimento do acordo político com o PT, pois não aceitavam que os nossos novos aliados se recusassem a estender a mão ao PTB. É fruto dessa mesma insatisfação a teoria sobre um acordo que envolveu cifras não menos sonhadoras.
A partir daí, o PTB passou a ser condenado publicamente como um partido que se vende por milhões em troca de apoio político. Nosso projeto partidário e nossa imagem ficaram prejudicados. E sabemos que esse golpe vai dificultar nossa trajetória no curto prazo. Neste momento de dificuldade me vem à mente a imagem da Batalha de Itararé, que nunca houve. Como esse acordo em que o PT teria oferecido R$ 10 milhões ao PTB.
A mim também assusta a ânsia com que algumas figuras públicas vão à mídia sugerir a instalação de uma CPI. CPI para apurar o quê? Buscam apenas os holofotes. Lembro-me da solidariedade que prestei ao senador Jorge Bornhausen pelo menos em duas ocasiões. A primeira, quando o senador Antonio Carlos o acusou de irregularidades na condução do seu partido, o PFL; e a segunda, no momento difícil pelo qual Bornhausen passou quando a pré-candidata à Presidência da República do PFL foi alvo de comentários na imprensa sob a acusação de esconder dinheiro de campanha dentro de sua empresa.
E o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso? Em vez de pedir uma CPI, nosso prestigioso ex-chefe de Estado poderia falar muito do PTB, não como um partido que se vende por dinheiro e cargos, mas como um partido que o apoiou por quatro anos sem pedir nada em troca. O PSDB desgastou a imagem do PTB, de 2002 a 2004, ao afirmar que trocaríamos o apoio à candidatura de Ciro Gomes pela de José Serra e o faríamos por interesses subalternos. Hoje, quando começamos a firmar nossa legenda perante a opinião pública, o PSDB nos acusa novamente de vendilhões. Conhecemos essa tática de cor.
Época de campanha eleitoral, entretanto, é um período em que vaca desconhece bezerro. Os falsos moralistas do momento execram o PTB, sem ter a coragem de reconhecer que o pedido ao PT não envolveu dinheiro público, mas a solicitação de apoio de um partido aliado a outro.
Por essa e outras, o PTB, que vinha se posicionando contra o financiamento público de campanhas, reconhece que o artifício até aqui usado de buscar recursos na iniciativa privada para reforçar o caixa de suas candidaturas é falho, deixando os partidos à mercê de preconceitos e tabus. Para a população, assim como para a imprensa, verba de campanha é sempre vista como uma entidade do mal, como se as práticas eleitorais não estivessem reguladas pela Justiça Eleitoral, e sim pelas regras de um tráfico abominável. Não compactuamos com isso. Se o preço da transparência eleitoral deve ser explicitamente pago pela sociedade, então que venha o financiamento público.

Roberto Jefferson Monteiro Francisco, 51, advogado criminalista, deputado federal pelo PTB-RJ, é o presidente nacional do partido.


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