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JOÃO SAYAD
Algazarra
Amigos do exterior dizem que
não é hora de voltar ao Brasil. Os
assuntos são repetitivos, o sentimento
é de frustração e os brasileiros estão
envergonhados.
Em economia, os juros caem. As
previsões mais otimistas imaginam
que a taxa de juros em julho de 2006
será 14% ou seja 10% acima da inflação. Continuaremos gastando 5% do
PIB, R$ 70 bilhões por ano com juros.
Uns repetem a história de que o Banco Central não tem poder de fixar os
juros, que são determinados pelo
mercado. Apesar das reuniões na segunda ou terceira quarta-feira de cada
mês. O governo diz que não podem
cair por causa das eleições presidenciais. O país continua sem estradas,
metrôs ou obras de saneamento. Pessimistas prevêem crescimento de
3,5%. Otimistas apostam em 4%. Governo e oposição concordam com o
equívoco que anula a possibilidade de
mudar os destinos do país miserável.
A crise da corrupção transformou-se em algazarra incompreensível. Não
se discutiu que controles falharam,
nem o que deve ser feito para evitar a
repetição. O resultado final é uma coleção de tragédias pessoais, fotos de
gente deprimida, barba por fazer, uma
exibição de injustiças praticadas em
nome da justiça.
Não se sabe as razões do referendo
de ontem. Qual o objetivo da proibição da produção e comercialização de
armas? O impacto sobre o porte de armas, principalmente dos bandidos,
deve ser nulo . Qual o impacto sobre a
produção de armas no Brasil? Parece
um engano, praticado em nome da
democracia participativa e do direito
de opinar.
A algazarra não é só brasileira. É global. No mundo, há consenso sobre a
urgência do combate à fome, à pobreza e à desigualdade. Muitos propõem
o aperfeiçoamento das medidas que
levaram à situação atual. Os críticos
propõem volta impossível ao passado.
O mundo vive momentos de liberdade total de expressão. O telefone celular, a internet, os e-mails criaram
uma possibilidade infinita de conversar, discutir e trocar idéias. Falamos
muito sobre muito pouco.
Depois de tanta conversa, não chegamos ao silêncio confortável que
existe entre velhos amigos nem ao silêncio magoado dos casais que se acusam mutuamente pela própria infelicidade. Há uma concordância ruidosa
não se sabe exatamente sobre o quê.
No meio do vozerio humano, apenas a velha natureza produz novos
sons: os trovões e o vento dos furacões, o ronco amedrontador dos terremotos. No Brasil, a Amazônia vive
uma seca! Primeira vez? Grave? Não se
encontram análises sobre o que está
acontecendo.
No Brasil de antigamente, os domingos eram dias de almoço de família
com avós, tios e tias, primos e primas.
Depois de comer, os adultos sentavam-se na sala para conversar enquanto as crianças iam brincar no jardim. Logo as mulheres dominavam a
conversa sobre coisas sem importância. Os homens, embalados pelas vozes familiares que ficavam cada vez
mais distantes, adormeciam.
Dormir com a música de vozes queridas e com a consciência de que se está dormindo é um raro prazer. Hoje, o
barulho da discussão não deixa ninguém dormir. E não há motivos para
prestar atenção ou ficar acordado.
João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
@ - jsayad@attglobal.net
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