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RUY CASTRO
Eu foco, tu focas, ele foca
RIO DE JANEIRO - Já tratei do
assunto nesta coluna, mas, como
diria o Cony, ninguém tomou providências. Continuamos a chamar
um filme de "longa", mesmo que ele
tenha a rotineira hora e meia de
projeção -o que, somando os trailers, os comerciais e o tempo que se
gasta indo lá fora comprar pipoca,
perfaz uma sessão ideal de duas horas. Então, por que "longa"?
Deve ser para distingui-lo dos
"curtas", que têm 12 ou 15 minutos.
Mas quantos curtas você vê por ano
a ponto de obrigarem um filme normal a ser chamado de longa? Longas, até outro dia, eram "E o Vento
Levou", "Os 10 Mandamentos",
"Ben-Hur" e "Lawrence da Arábia",
que duravam para lá de quatro horas. Se, hoje, qualquer filme é um
longa, o que seriam aqueles queridos mamutes?
Ou, quando se trata de filmes do
passado -digamos, "A Malvada",
com Bette Davis, ou "Barnabé, Tu
És Meu", com Oscarito-, lê-se às
vezes que eles foram gravados assim ou assado. Só que os filmes do
passado não eram gravados. Eram
filmados. Quem grava imagens é a
televisão, e o cinema, pelo menos o
anterior a 1990, sempre dependeu
de película, laboratório, revelação e
outras práticas ancestrais.
Falando em gravar, não perdemos a mania de escrever que "Fulano entrou em estúdio para gravar
seu novo CD". Mas onde queriam
que ele o gravasse? Na rua, do outro
lado da calçada? "Entrar em estúdio para gravar" é o mesmo que
"apostar todas as fichas", "correr
atrás do prejuízo" ou "dar nó em
pingo d'água". É escrever sem ter de
pensar. Uma palavra puxa outra,
como uma locomotiva que arrasta
vagões vazios.
Mas minha grande birra é com o
verbo focar. Quando leio, por exemplo, que "Ronaldo foca voltar à seleção", conjugo imediatamente eu foco, tu focas, ele foca, e imagino o Fenômeno batendo as nadadeiras.
Com todo o respeito.
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