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ANTONIO DELFIM NETTO
Inflação e eleição
Dois economistas do Banco Interamericano de Desenvolvimento fizeram um estudo detalhado
dos resultados de 66 eleições presidenciais e 81 eleições legislativas em
países latino-americanos de 1985 a
2003. Foi o período em que os governos deram grande ênfase "retórica" às
reformas sugeridas pelo Consenso de
Washington (sem tê-las realizado).
Ao longo dessa vintena de anos, o
Consenso foi se dissolvendo até aceitar a qualificação mais recente de "entulho neoliberal"... (Eduardo Lora e
Maurício Oliveira, "As conseqüências
eleitorais do Consenso de Washington", in "Economia", vol. 5, nº 2,
Spring 2005).
A grande verdade é que nenhum dos
países latino-americanos (com a possível exceção do Chile) aplicou o receituário do Consenso, a começar pelas
diversas brincadeiras que fizeram
com a taxa cambial e com os duvidosos expedientes fiscais que nunca produziram o equilíbrio duradouro das
contas públicas, dos quais o Brasil é
um exemplo. Misteriosamente, do
Consenso, os países apressaram-se a
aplicar apenas a recomendação de
"privatizar o setor público", o que,
certamente, aumentou a produtividade dos setores privatizados. Em todos
os países, entretanto, as privatizações
envolveram tenebrosas transações, a
ponto de serem chamadas de "privatarias" e desmoralizaram os seus executores.
Esse pequeno "suelto" destina-se a
divulgar as conclusões daquele excelente artigo para ampliar o debate a
respeito do assunto. Quais são elas?
1ª) Que o suporte eleitoral para o
presidente incumbente é tanto maior
quanto melhores forem os resultados
econômicos agregados de sua administração. Nas eleições presidenciais, o
presidente é mais beneficiado pela redução da inflação do que qualquer outro resultado. Nas eleições legislativas,
parece (mas o resultado não é estatisticamente robusto) que o fato mais
importante é a taxa de crescimento;
2ª) A sensibilidade do suporte eleitoral dos resultados econômicos depende das características institucionais do
regime político e do sistema partidário. A redução da inflação continua a
ser o fator mais importante para a vitória do incumbente, principalmente
quando há uma forte polarização;
3ª) O suporte eleitoral do incumbente depende da política econômica
adotada, uma vez que essas políticas
implicam em custo eleitoral mesmo
quando produzem bons resultados
econômicos agregados, mas
4ª) a tolerância do eleitorado com políticas impopulares depende da ideologia revelada do incumbente e do estado da economia.
Logo, se o mundo continuar o mesmo, se a inferência estatística for correta e se o governo permitir ao Brasil
crescer entre 4,5% e 5% com inflação
menor do que 5%, Lula terá alguma
vantagem eleitoral. A esta se somará o
fato de ser beneficiário do indecente
processo de reeleição sem desincompatibilização inventado por FHC. Nos
países sem controle social, como o
Brasil, ele desequilibra o processo eleitoral a favor do incumbente.
Mas não se alegrem prematuramente, gregos e troianos! Ainda vale a primeira lei de Tancredo: "Quanto maior
e mais sangrenta a polarização, tanto
mais vantagem tem quem corre por
fora"...
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
@ - dep.delfimnetto@camara.gov.br
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