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OPIOFOBIA
"Pois não houve ainda filósofo que suportasse a dor de
dente com paciência." A frase, de
Shakespeare ("Muito Barulho por
Nada"), remete ao aspecto mais orgânico da dor física, que está além de
filosofias e teorias. Na dor, o homem
é igual à maioria dos animais. Apenas a cessação dos estímulos dolorosos é capaz de trazer alívio.
E a relação da medicina com a dor é
problemática. Em princípio, existe
um amplo arsenal de possibilidades
terapêuticas à disposição dos médicos, desde analgésicos comuns, como a Aspirina e a Novalgina, até poderosos opióides, mil vezes mais fortes do que a morfina. O problema,
como bem mostrou Drauzio Varella
em sua coluna na Folha no último
sábado, é que nem sempre os médicos estão prontos a usá-lo da melhor
maneira possível.
Certas dores são resistentes a drogas menos poderosas. Elas só cedem
a opióides, cujos efeitos colaterais,
notadamente a dependência, são conhecidos e temidos. Talvez exageradamente. Na prática, derivados da
morfina só são receitados em regime
de maior duração para pacientes terminais que se encontrem hospitalizados. Se o paciente sofre de dor
não-maligna ou não está internado,
torna-se difícil utilizar a medicação.
O médico teme receitá-la, a família
reluta em ministrá-la, e a burocracia
dificulta a aquisição.
É claro que é preciso ter cuidados
na prescrição de opióides, mas eles
extrapolam o limite do razoável
quando impedem que uma pessoa
que precisa da droga para aliviar sua
dor a obtenha. Quando isso ocorre, o
médico falha em sua missão de oferecer conforto ao paciente.
A dor é um dos temas em moda na
medicina. Nos últimos anos produziram-se centenas de estudos sobre a
dor crônica. A maioria deles sugere
que são raríssimos os casos de dependência entre pacientes que utilizaram opióides para controlá-la. Alguns desses estudos chegam mesmo
a condenar uma certa "opiofobia".
Como sugeriu Varella, é preciso rever a abordagem da dor ensinada nas
escolas médicas bem como as exigências das autoridades sanitárias.
Não há razão para, por medo de uma
possível dependência, condenar
uma pessoa a dores excruciantes.
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