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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Estupra, mas não mata
SÃO PAULO - Não resta nenhuma
dúvida sobre a infelicidade da frase
de Marta Suplicy. A própria ministra logo percebeu a bobagem e tentou corrigir-se, pedindo desculpas.
Não funcionou. A "dica de viagem"
está incorporada à sua biografia política e certamente ainda irá lhe
render vários constrangimentos.
De imediato, serviu para conectá-la
ao apagão aéreo, problema sobre o
qual a titular do Turismo tem tanta
responsabilidade quanto a sua colega do Meio Ambiente, Marina Silva,
-isto é, nenhuma.
"Relaxa e goza!" Marta foi vítima
da sua autoconfiança, acabou traída
pela espontaneidade. Ofendeu
quem já estava sendo desrespeitado
em seus direitos e/ou humilhado
nos aeroportos. Deveria ficar por aí.
Impressionam, no entanto, a insistência e a violência dos ataques à
ministra, as facilidades e os exageros comparativos, os estupros do
bom senso cometidos nos últimos
dias. Não é preciso ir muito longe
para constatar a fúria machista recalcada na fala dos marmanjos.
Marta não é Maluf. Muita gente
quis comparar a frase da primeira
ao célebre "estupra, mas não mata".
Não faz nenhum sentido. Maluf se
referia a um caso concreto de estupro seguido de morte quando formulou sua sentença singela. Alegar
que "relaxa e goza" tem como premissa a frase "se o estupro é inevitável" equivale a usar uma verdade fora de contexto para produzir uma
mentira como resultado. É ma-fé.
Goste-se ou não, boa parte da vida pública de Marta está ligada a
posições avançadas sobre comportamento e sexualidade, ao esclarecimento e à emancipação da mulher e à defesa de minorias.
O auge do obscurantismo, o supra-sumo da boçalidade pertence a
Alexandre Garcia, que no "Bom
Dia, Brasil" comparou o "relaxa e
goza" da ministra à inscrição "o trabalho vos libertará", dos pórticos
dos campos de concentração do nazismo. O deboche é o mesmo, disse.
Ainda somos um país de sorte.
Seria bem pior se o jornalista Garcia fosse ministro da Propaganda.
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