São Paulo, terça-feira, 25 de julho de 2006

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Malogro na OMC

Intransigência dos ricos suspende negociações para reduzir barreiras ao comércio mundial; risco é a fragmentação de regras

A RODADA Doha de negociações multilaterais de comércio no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), lançada na capital do Qatar em 2001, foi suspensa. Os países do G6 -Austrália, Brasil, Índia, Japão, União Européia e Estados Unidos-, que respondem por três quartos do comércio global, não chegaram a um acordo sobre a redução dos subsídios agrícolas.
O malogro dessas discussões complica o cenário futuro dos acordos multilaterais devido ao vencimento em julho de 2007 do mecanismo constitucional ("fast-track") que concede autorização à Presidência dos EUA para negociar acordos sobre comércio, que podem ser aceitos ou rejeitados sem alterações.
O grande obstáculo a essas negociações provém do fato de os EUA e a UE não aceitarem uma redução de suas barreiras tarifárias e não-tarifárias às importações de produtos agrícolas. Para isso, eles requerem dos países em desenvolvimento uma significativa abertura nos produtos industrializados e serviços. Os EUA possuem tarifa média sobre produtos industrializados de 3,2%; a UE, de 4%. Eles pretendem "nivelar o campo de jogo", condicionando as negociações agrícolas a uma redução das tarifas de produtos industriais dos países em desenvolvimento.
Todavia, para concluir a Rodada Uruguai (1993), os países em desenvolvimento aceitaram a promessa dos desenvolvidos de uma maior abertura dos mercados agrícolas e de produtos intensivos em trabalho em troca da criação da OMC e de um conjunto de novas regras sobre subsídios, antidumping, serviços, direito de propriedade etc. A promessa não foi cumprida. Agora, os países em desenvolvimento estão sendo coagidos a realizar novas concessões em bens industriais, sendo que os possíveis ganhos em termos de acesso aos mercados dos produtos agrícolas dos países desenvolvidos seriam muito limitados.
De acordo com a OMC, as subvenções governamentais totais à agricultura, indústria e serviços podem superar US$ 1 trilhão por ano, valor equivalente a 4% do PIB global. A definição de subsídios não é consensual entre os diferentes países. De todo modo, em proporção da renda nacional, os países desenvolvidos recorrem mais a essas práticas do que as nações em desenvolvimento.
Numa amostra com 31 países em desenvolvimento, a ajuda governamental representou, em média, 0,6% do PIB. Entre 22 nações ricas, o percentual alcançou 1,4% do PIB. A ajuda do governo brasileiro somava 1,8% das despesas públicas, o equivalente a 0,3% do PIB, no período 1998-2002. Na Índia, as subvenções chegaram a 21% das despesas públicas; na China, a 5,7%.
Há muito está evidente que as nações desenvolvidas precisam avançar em suas propostas de abertura dos mercados agrícolas se pretendem retomar as negociações multilaterais. O efeito da suspensão da Rodada de Doha pode ser a proliferação de acordos bilaterais e regionais de comércio, fragmentando ainda mais as normas e as regras sobre o comércio internacional.


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