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CLÓVIS ROSSI
Corsários e piranhas
SÃO PAULO - Se você quer entender melhor como funciona a cabeça dos
corsários, tratados como agentes do
mercado, esqueça um pouco o Brasil.
Olhe para a Alemanha.
Lá, a turbulência de anteontem foi
atribuída à vitória da social-democracia do primeiro-ministro Gerhard
Schröder, que seria um obstáculo às
"reformas" que o mercado quer.
Volte agora à genealogia dessa social-democracia: Schröder elegeu-se,
em 1998, graças a uma guinada para
o centro. Até cunhou um slogan
("Neu Mitte", "Novo Centro") para
designar o afastamento da antiga retórica estatizante.
À época, sua eleição não provocou
turbulência, porque o "Novo Centro", como a "Terceira Via" de Tony
Blair, eram o novo "must" dos fundamentalistas de mercado.
Derrubados os "vermelhos" (o comunismo), desbotava também o cor-de-rosa (símbolo da social-democracia), que servira para entregar anéis
ao populacho, para evitar que ele pedisse os dedos.
Schröder até fez algumas reformas,
mas os corsários são também piranhas: à primeira gota de sangue que
cai no rio, ensandecem e pedem mais,
pedem tudo.
É verdade que o estado de bem-estar social alemão contém exageros.
Mas o que o mercado quer é jogar fora a criança (o bem-estar) junto com
a água do banho (os exageros).
Só assim se explica o fato de que a
turbulência foi atribuída à "instabilidade política alemã". É insano. Se há
país politicamente estável, é a Alemanha do último meio século.
Volte agora ao Brasil. Grande parte
do jogo de alguns agentes de mercado
nos últimos meses é parente muito
próximo desse comportamento de
corsários/piranhas que os agentes de
mercado estão adotando em toda
parte, com ou sem eleição.
Se aqui se usa o pretexto do "Serra
ou o caos", na Alemanha ganhou o
Serra teutônico e, ainda assim, a
bandeira negra foi hasteada e singrou os mares.
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