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MARTA SALOMON
"Gente boa"
BRASÍLIA - Quando chegou ao Planalto, a turma de Fernando Henrique Cardoso pôs a palavra "gelatina"
no vocabulário político do país. Servia para designar intramuros o político que não era aliado cego -poucos o são-, mas aceitava votar com
o governo em troca de favores.
Valiam no jogo a liberação de verbas públicas, um cargo na Esplanada
ou até mesmo moedas mais prosaicas, como encontros com autoridades. "Gelatina", coisa que cede a colheradas das mais sutis, era a variante tucana para o fisiologismo.
Na época, o PT condenava o negócio. Isso foi até Luiz Inácio Lula da
Silva pisar no Planalto. Como fisiologismo continua soando como nome
feio, a palavra agora é "gente boa".
Essa foi a senha ouvida em reuniões
no palácio para liberar verbas para
projetos de interesse dos aliados.
"Gente boa" povoa o universo que
garantiu a Lula o apoio necessário à
aprovação das reformas no Congresso. Reformas que, no fim das contas,
engordarão os cofres públicos.
O governo acha que saiu no lucro.
Ainda que gente -não muito boa,
segundo a classificação palaciana-
como o ex-petista Chico Oliveira diga
que, com essas e outras, o partido
"perdeu a parada" de uma nova moralidade na política.
Mas de uma coisa o PT não pode
ser acusado: de falta de discrição. Por
discreto, o governo Lula atendeu até
adversários. Nada ficou muito evidente fora das planilhas a que só ministros e um grupo restrito de assessores têm acesso.
Veja só o exemplo da medida provisória que aumentou de 3% para
7,6% a alíquota da Cofins, contribuição cobrada sobre o faturamento das
empresas.
De forma discretíssima, entre remissões a alíneas e parágrafos de leis,
o texto do governo livrou dois setores
da economia: segurança privada e
venda de automóveis. Por coincidência, áreas em que o líder do PMDB,
Eunício Oliveira (CE), tem negócios.
Eunício é "gente boa" e pode até virar
ministro em breve.
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