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Corrida pelo álcool
Meta de substituir gasolina nos EUA cria oportunidades ao etanol do Brasil, mas é preciso prevenir efeito ambiental
O DISCURSO de George W.
Bush sobre o Estado da
União, na terça, lançou
um sinal claro em favor dos biocombustíveis. A prometida substituição de 20% do
consumo americano de gasolina
por combustíveis renováveis, até
2017, teria efeito profundo, para
o bem e para o mal, sobre os dois
maiores produtores de etanol do
mundo, EUA e Brasil.
Mesmo sem a meta ora fixada
por Bush, já se presencia um
enorme aumento da demanda
pelo álcool de cana brasileiro. A
produção não pára de crescer
desde 2000. A alta se explica pela
venda de mais de 1,7 milhão de
veículos flex no mercado interno, a partir de 2003, mas também pela procura externa.
Apenas para os Estados Unidos, produtores brasileiros embarcaram 1,5 bilhão de litros no
ano passado, metade do total exportado. O volume enviado para
o mercado americano multiplicou-se mais de seis vezes em apenas um ano, de 2005 para 2006.
As exportações para a União Européia também crescem e representam hoje pouco mais de um
terço da quantidade destinada
aos EUA.
A origem desse apetite havia
sido, até agora, a diminuição do
uso do aditivo MTBE na gasolina
americana. Adicionado para melhorar a combustão, o composto
foi banido na maioria dos Estados americanos porque se verificou que contaminava lençóis
freáticos. A alternativa foi substituir o MTBE por etanol, também ele um aditivo.
Etanol produzido nos EUA a
partir do milho cobre a maior
parte da demanda assim criada.
A obtenção de álcool desse cereal
tem eficiência muito menor
(3.900 litros por hectare) que a
de cana-de-açúcar (6.500 l/h) e
custo de produção maior (30
centavos de dólar por litro contra 22 no caso da cana). Para proteger seus produtores, os EUA
impõem sobretaxa de 14 centavos por litro ao etanol brasileiro.
Essa política protecionista terá
de mudar. Estima-se que a produção americana de milho poderá suprir só 15 bilhões dos 35 bilhões de litros de etanol necessários em 2017. A alternativa à importação seria produzir álcool de
celulose, mas o processo está
longe da maturidade industrial.
Além do mais, direcionar a
maior parte do milho para produzir combustível afeta o preço
de alimentos -o grão é componente de rações animais. Antes
do discurso de Bush, o preço do
quilo do frango nos Estados Unidos subira 12 centavos, como reflexo da corrida ao milho. O mesmo pode ocorrer com bovinos e
suínos. O Brasil, grande produtor de carne e grãos, será inevitavelmente beneficiado.
Quanto ao etanol, o país não
representaria o único fornecedor ao mercado americano nesse
novo cenário, mas seria o principal. Nenhuma outra nação reúne
tantas condições favoráveis para
suprir tal demanda.
De tecnologia e produtividade
a dezenas de milhões de hectares
de pastagens pouco produtivas
para ceder lugar à cana, o Brasil
vislumbra um amplo horizonte
para acelerar a produção e a exportação. Só precisa cuidar para
que isso não se faça à custa das
florestas, se a cana deslocar pecuária e sojicultura para novas
frentes agrícolas.
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